Amparo à pesquisa no país dá sinal de crescimento


A evolução do sistema nacional de ciência e tecnologia contabilizou avanços nos últimos anos, mas eles ainda são insuficientes para diminuir a histórica desigualdade regional dos investimentos em pesquisa e desenvolvimento. Peça fundamental nas políticas locais para C&T, o movimento de criação de fundações de amparo à pesquisa (FAPs), iniciado nos anos 1990 e acelerado na última década, foi adensado nos últimos dias de 2009, com a criação da Fundação Tumucumaque, no Amapá. No entanto, a maioria das FAPs ainda encontra dificuldades para executar orçamentos próximos previstos nas leis.

Na avaliação do presidente do Conselho Nacional das Fundações Estaduais de Amparo à Pesquisa (Confap), Mário Neto Borges, o sistema nacional de ciência, tecnologia e inovação evoluiu bem nos últimos anos, mas precisa melhorar mais. Um dos pontos positivos da última década é a articulação entre Governo Federal e Estados, marcada, segundo Borges, pelo bom diálogo entre o Ministério da Ciência e Tecnologia (MCT), suas agências de fomento, a Coordenação de Aperfeiçoamento Pessoal de Nível Superior (Capes) e as FAPs. Outra vitória é a recente evolução de algumas fundações.

src=https://www.fapeam.am.gov.br/arquivos/imagens/imgeditor/eliza%20e.JPG“Há quatro anos, só a Fapesp (Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do São Paulo) tinha orçamento integral”, disse Borges, referindo-se ao cumprimento das constituições estaduais, que, na maioria, preveem patamares mínimos de repasse para os orçamentos das FAPs. Hoje, as Fundações de Minas Gerais (Fapemig, presidida por Borges) e Rio de Janeiro (Faperj) também executam os orçamentos previstos em lei. “Em seguida, a Fapeam (Amazonas) e a Facepe (Pernambuco) tiveram grande crescimento”, completou Borges, que também destacou o sucesso recente do Pará.

Mas o quadro geral do país ainda preocupa. “Vinte Estados não cumprem os dispositivos das constituições estaduais”, lembrou o presidente da Confap. Com a criação da Fundação Tumucumaque, 24 unidades da Federação possuem FAPs. Rondônia, Roraima e Tocantins seguem sem.

Investimentos

O descumprimento das constituições estaduais se reflete em baixos investimentos locais em ciência e tecnologia. Apenas São Paulo e Paraná se destacam. Segundo dados do portal Indicadores Nacionais de Ciência e Tecnologia, do MCT, o governo paulista investiu, em 2007, 3,67% de sua receita total em C&T; o governo paranaense investiu 2,67% no mesmo ano, enquanto a média total foi de 1,66%. Na série histórica, desde 2000, o investimento paulista ficou abaixo de 4% somente em 2005, 2006 e 2007. Já o paranaense manteve-se acima de 2% desde 2001.

Em termos absolutos, em 2007, as unidades da Federação gastaram R$ 2,6 bilhões na área. Em 2008, o valor subiu para R$ 3,3 bilhões, segundo compilação preliminar do MCT. Embora faltem dados confiáveis, levantamento preliminar da Confap aponta que 19 FAPs (excluídas as de Alagoas, Goiás, Maranhão e Paraíba) executaram R$ 1,4 bilhão em 2008 – valor superior ao orçamento do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq). Mas a Fapesp, sozinha, respondeu por R$ 637 milhões, ou 45%.

Aumentar esses valores é passo importante para atingir a meta de fazer crescer o investimento nacional em pesquisa e desenvolvimento. O diretor-científico da Fapesp, Carlos Henrique de Brito Cruz considera o crescimento do número de cientistas (pequeno relativamente ao tamanho da população) como o principal desafio. Para vencê-lo, os Estados também precisam investir.

Fatores

Enquanto a capacidade de investimento em fomento da Fapesp vem de antes da estruturação do sistema nacional, a evolução de outras FAPs ainda necessita consolidar-se. Segundo Borges, do Confap, três fatores são fundamentais: em primeiro lugar, a decisão política dos governos estaduais de cumprirem a lei. Em seguida, vem a capacidade de mobilização das comunidades científicas locais para cobrarem investimentos. Por fim, surge a conscientização da sociedade sobre investimentos em C&T. Os três fatores estão evidentemente conectados.

“Em Minas, a mobilização da comunidade científica somou-se à posição do atual governo de usar a Fapemig como vetor de desenvolvimento”, afirmou o presidente do Confap, referindo-se ao caso da FAP presidida por ele.

Por e-mail, o diretor-científico da Facepe, Alfredo Arnóbio de Souza da Gama, avalia que “a vontade pessoal do atual governador, que tem demonstrado sua convicção da importância da CT&I”, foi determinante para a Fundação passar de investimentos na casa de R$ 3 milhões, até 2006, para R$ 20 milhões, em 2008. Ano passado, a Fundação pernambucana executou R$ 30 milhões de seu orçamento e, para 2010, a previsão é de R$ 40 milhões. Segundo Gama, o orçamento não tem tido problemas de execução.

No Amazonas, também é o apoio político do governo estadual o componente principal do sucesso recente, segundo o diretor-presidente da Fapeam, Odenildo Sena. A Fundação foi criada em 2003, no primeiro governo do atual governador, Eduardo Braga. “A FAPEAM é a quarta fundação que mais investe”, informou Sena. Em 2008, foram R$ 45 milhões de orçamento executados. No ano seguinte, por causa da crise global, a Fapeam investiu R$ 40 milhões dos R$ 78 milhões previstos. Para 2010, estão previstos R$ 67 milhões.

Depender da vontade política dos governos não parece ser a forma mais eficaz de garantir o fortalecimento do sistema nacional de C&T, mas, por outro lado, as garantias legais não têm sido suficientes para aumentar os investimentos locais. O presidente do Confap ressaltou a importância de se aperfeiçoar os marcos legais, “poucos estabelecidos”. Outro ponto importante, segundo ele, é dotar as legislações de instrumentos para racionalizar a atuação dos órgãos de controle – Tribunais de Contas estaduais e da União, que muitas vezes não levam em conta as especificidades dos gastos em C&T.

Brito Cruz, da Fapesp, sugere outro caminho: o planejamento estratégico do sistema nacional deveria reforçar o incentivo à criação de instituições estaduais de pesquisa. “Em São Paulo, a maior parte do investimento público em pesquisa e desenvolvimento é estadual porque as principais universidades são estaduais”, lembrou.

Para ele, o investimento em fomento à pesquisa não é suficiente para cumprir a meta de aumentar o número de pesquisadores no país. “As FAPs fomentam os cientistas já existentes”, disse Brito Cruz, completando que novos pesquisadores dependem de mais instituições de pesquisa, com novas vagas.

Ciclo Vicioso

Sobretudo nos Estados fora do centro-sul do país, onde há menor densidade de pesquisadores e instituições, a demanda por investimentos locais em fomento exerce menos pressão política pelo cumprimento das leis que garantem recursos para as FAPs. Isso dá forma a um ciclo vicioso, que dificulta o aumento dos investimentos estaduais.

src=https://www.fapeam.am.gov.br/arquivos/imagens/imgeditor/eli.JPGPara romper essa lógica, o MCT tem apostado em seu poder de articulação e em parcerias baseadas na exigência de contrapartidas de investimento estadual. Segundo Sonia Maria Jin, assessora da Secretaria Executiva do MCT, as contrapartidas induzem a organização dos sistemas locais de ciência e tecnologia, fortalecendo secretarias e FAPs, aumentando os investimentos locais e, assim, gerando densidade de pesquisadores e instituições. “Secretarias e FAPs têm que se organizar para compor as parcerias”, disse Sonia, ex-dirigente de C&T no Mato Grosso do Sul e responsável por essa articulação no MCT.

O movimento de articulação local também favorece a criação de novos marcos legais. Treze Estados (Alagoas, Amazonas, Bahia, Ceará, Goiás, Mato Grosso, Minas Gerais, Pernambuco, Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul, Santa Catarina, São Paulo e Sergipe) já têm leis estaduais de inovação, segundo o Conselho Nacional de Secretários Estaduais para Assuntos de CT&I (Consecti). Além disso, Distrito Federal, Pará, Paraíba, Paraná e Rio Grande do Norte deram início ao processo de criação.

Par vencer as desigualdades regionais – muitas FAPs não têm legitimidade junto ao governo, nem independência; algumas leis necessitam aperfeiçoamento – Sonia Jin considera fundamental a institucionalização das parcerias entre Governo Federal e Estados. O Comitê Executivo que reúne o ministério, o Confap e o Consecti têm avançado nesse sentido, segundo ela. Mas a principal oportunidade está na 4ª Conferência Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação (CNCTI), em maio, quando a institucionalização da articulação será debatida como ferramenta de uma política de Estado.

Fotos: Giovanna Consentini (1) e Arquivo Fapeam (2)

  Vinicius Neder – Jornal da Ciência

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