Preservação: Não basta a Amazônia fazer o dever de casa
O pesquisador Niro Higuchi está sempre alerta aos danos que vêm sendo causados ao meio ambiente, principalmente à Amazônia. Ele é coordenador do Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia (INCT) Madeiras da Amazônia – projeto que recebe aportes de R$ 4,7 milhões, sendo R$ 2 milhões da Fapeam, para desenvolver pesquisa, formação de recursos humanos e transferência de conhecimentos para a sociedade – e foi um dos principais palestrantes da Cúpula Amazônica dos Governos Locais, que aconteceu em outubro. Para o pesquisador, que atua no Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa), não basta apenas a Amazônia fazer o dever de casa, todos precisam unir esforços para inibir as agressões ao meio ambiente.
Agência Fapeam: As mudanças climáticas têm sido o foco de quase todas as discussões acerca do meio ambiente. Muitas comentam o caos no clima e sempre há um exemplo de seca, cheia ou tornado a ser oferecido, mas sabemos que há pessoas preocupadas em ir contra a maré, principalmente aqui no Amazonas. O senhor poderia citar se existem projetos que podem servir como exemplo para garantir a floresta em pé?
Niro Higuchi: Existem projetos que trabalham com os instrumentos de Redução de Emissões por Desmatamento e Degradação Florestal (Redd), como é o caso da Reserva do Juma (projeto que prevê conter a emissão de aproximadamente 3,6 milhões de toneladas de CO2 que seriam geradas até 2016 devido ao desmatamento em consequência da grilagem de terras, extração ilegal de madeira, produção de soja e outras atividades agropecuárias. As reduções de emissões geradas serão transformadas em créditos de carbono, que poderão ser utilizados por hóspedes da Rede de Hotéis Marriott para compensar suas emissões). Mas também temos outros, como o do próprio Mamirauá, em que a comunidade local trabalha com os recursos naturais e ainda consegue manter a floresta em pé.
Agência Fapeam: As manifestações nesse sentido ainda são insuficientes para nossa realidade. Precisamos fazer mais?
NH: Claro que precisamos fazer mais. Quando você coloca a Amazônia em termos globais, temos hoje no mundo as emissões via queima de combustíveis fósseis e outros processos industriais, que respondem por 80% de emissões no mundo, e as emissões via uso do solo, desmatamento, que respondem por 20%. A Amazônia participa com menos de 10% nesse processo. Se controlarmos 100% desse desmatamento, estaremos resolvendo 10% do problema climático do mundo. Temos que fazer nossa parte para futuras gerações do país, mas só a Amazônia fazer o dever de casa não vai resolver o problema todo.
Agência Fapeam: Já se percebe uma vontade maior de outros Estados e até países em desenvolver ações para reverter as agressões ao meio ambiente?
NH: Começamos a perceber essas mudanças, até porque hoje vemos o aumento dos fenômenos com mais frequência e intensidade. Em Santa Catarina, por exemplo, temos tornados. Infelizmente, só se começa a dar valor quando se perdem vidas e negócios são prejudicados. O mundo começa a se mobilizar e ficar mais sensível a esses problemas.
Agência Fapeam: Qual o papel da Amazônia nesse cenário?
NH: A Amazônia tem sido sempre citada, mas não tem voz e nem voto nesses debates, por isso a importância da participação dos governos locais, que precisam se posicionar e tomar decisões [diz, referindo-se ao evento que foi realizado em outubro, no Centro de Convenções Studio 5, e reuniu prefeitos dos municípios da Amazônia Legal]. Será que Manaus, que é uma metrópole, está preparada ou sabe de suas vulnerabilidades? Se ocorrer um tornado aqui, estaremos preparados? Algumas obras de engenharia têm que ser alteradas. Os currículos das escolas têm que ser modificados, treinamentos têm que ser incluídos.
Agência Fapeam: Principalmente porque aqui em Manaus já estamos sentindo os efeitos das mudanças climáticas…
NH: Sim, hoje estamos falando de seca, há três meses estávamos falando de cheia. Com isso não conseguimos nem definir mudança climática. Hoje a única certeza que temos é de que o clima está caótico, uma bagunça, e estamos reclamando de tudo, porque antes podíamos planejar o calor e o frio.
Agência Fapeam: Essa situação é reversível?
NH: É difícil, mas claro que é reversível. Na minha opinião, o pior de tudo é que esses fenômenos estão acontecendo com mais frequência e não são consequências dos estragos que estamos fazendo nos últimos 10 anos. É coisa mais antiga. Assim, o que fazemos hoje vai refletir daqui a 30 ou 40 anos. Para reverter, temos que fazer de tudo um pouco, definitivamente temos que controlar as emissões.
Leila Ronize – Agência Fapeam