Pesquisadores do INPA detectam nova doença no Brasil
O projeto foi coordenado pelo pesquisador do Laboratório de Etnoepidemiologia (Letep) do Instituto, Victor Py-Daniel. Também fazem parte da pesquisa os cientistas do INPA: Jansen Fernandes de Medeiros, Guilerme Maerschner Ogawa, Ulysses Carvalho Barbosa, Orlando Santos e Eliseu da Silva.
A filaria, que já havia sido descoberta na Venezuela e na Colômbia, foi detectada durante uma expedição que aconteceu em março desse ano, onde foram feitas diversas coletas no rio Içãna, localizado entre as comunidades Tunuí Cachoeira e Boa Vista. Além da M. perstans, os pesquisadores encontraram nos moradores das etnias Baniwa, Kuripaco e Baré a Mansonella ozzardi. "Alguns moradores apresentaram contaminação com uma ou a outra espécie, mas havia um número acentuado de dupla infecção", explicou Py-Daniel.
A Mansonella perstans é de origem africana, enquanto a já conhecida M. ozzardi procede das Américas Central e do Sul.
De acordo com o cientista, o objetivo do trabalho é verificar a prevalência da mansonelose no Alto Rio Negro (ambas as espécies), bem como os vetores das referidas enfermidades e os graus de infecção humana. O grupo de pesquisa também se propõe a associar estudos de sintomatologia, a fim de descartar os sintomas que parecem ser da M. ozzardi, mas não são.
"Queremos associar estudos de psicologia para fazer o cruzamento dos seguintes dados: sintomatologia, área geográfica, gênero e idade; pois ocorrem alterações que desviam as pessoas positivas de manterem ações consideradas normais, principalmente fragilizadas emotivamente", ressaltou.
Segundo ele, nos outros países as duas filarias, tanto a M. ozzardi como a M. perstans , são transmitidas por "maruins, conhecidos como mosquito pólvora". Porém no Brasil, até o momento, a M. ozzardi só foi detectada por transmissão através de simulídeos, ou seja, piuns.
O pesquisador alertou que, possivelmente, as pessoas que moram próximas de fronteiras terão índices mais elevados de contaminação. Esta expectativa tem como base os elevados níveis de infecção encontrados nas pesquisas iniciais, entre os indígenas dos rios Içanã e Waupés.
"A prevalência da filaria M. perstans entre membros do Exército Brasileiro de Maturacá (AM), fronteira com a Venezuela, e Tunuí Cachoeira (AM), fronteira com a Colômbia, foi de 10% e 7,69%, respectivamente, o que é considerado elevado. Já a prevalência de M. ozzardi nas comunidades de Maturacá, Ariabu, Auxiliadora e Ya-Nazaré foi de 8,88%, em todas as comunidades. A dupla infecção de mansonelose nas comunidades do Içãna (Tunuí Cachoeira, Castelo Branco, Assunção, Nazaré, Camarão, Pirauiara, Boa Vista) foi de 33,82%", alertou.
Py-Daniel informou ainda, que alguns casos de filariose foram tratados pelo Distrito Sanitário Especial Indígena da Fundação Nacional de Saúde (DSEI/Funasa), contudo não tiveram continuidade porque algumas pessoas apresentaram elevadas reações secundárias ao Ivermectina (droga utilizada contra M. ozzardi). Segundo o cientista, o fato aconteceu porque o medicamento é impróprio quando há a presença de M. perstans.
Além do INPA, por meio Laboratório de Etnoepidemiologia do Núcleo de Pesquisas em Ciências Humanas e Sociais (NPCHS/INPA), participam da pesquisa a Fundação Estadual dos Povos Indígenas (Fepi) e o Exército Brasileiro por meio do Hospital Geral Universitário (HGU).
Tratamento – A masonelose causada pela M. ozzardi é combatida por meio do medicamento Ivermectina, o mesmo utilizado para combater a oncocercose, Onchocerca volvulus, um outro tipo de filaria que causa cegueira em índios da Terra Indígena Yanomami.
Já para combater a M. perstans, Py-Daniel explicou que o fármaco preferível é a dieticarbamazina, apesar de existirem poucas evidências sobre sua eficiência terapêutica. A droga é utilizada de 8 a 10 mg/kg/d durante 21 dias.
"Normalmente são requeridos vários ciclos da M. perstans para reduzir os sintomas ou a eusinofilia, que é a quantidade anormal de eosinófilos no sangue. Contudo, a Invermectina e o Albendazol não são eficientes, mas pode ser aplicado um tratamento alternativo à base de mebendazol (100 mg duas vezes ao dia, durante 30 dias) sozinho ou associado à outra droga: levamisol", afirmou.
Sintomas da M. perstans – A presença de M. perstans no organismo é em geral assintomática, ou seja, não apresenta sintomas. Porém, em alguns casos está associada a quadros de angioedema – um inchaço causado por acumulo de líquidos nas camadas profundas da pele – e prurido (coceira), semelhante ao edema de Calabar da loaisis (filaria existente no continente africano). Na minoria dos casos, o paciente apresenta febre, cefalalgias (dores de cabeça), dor nas juntas e no hipocôndrio direito (parte da região abdominal), hepatite, desordens neuropsiquiátricas, pericardite – inflamação na membrana do coração e meningoencefalite – inflamação que compromete a meninge e o encéfalo.