Pesquisador fará inventário da diversidade de insetos nas áreas de fronteiras do AM
A Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Amazonas (Fapeam) e o Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) aprovaram mais um projeto no Programa de Apoio a Núcleos de Excelência (Pronex), elevando para cinco as pesquisas selecionadas no último edital. O pesquisador José Albertino Rafael, do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa), vai desenvolver a pesquisa intitulada “Amazonas: diversidade de insetos ao longo de suas fronteiras”, com uma equipe de 31 pessoas, incluindo pesquisadores principais, pesquisadores colaboradores, técnicos e estudantes de graduação e pós-graduação. O recurso para o financiamento da pesquisa é o mesmo de projetos anteriores: R$ 450 mil. Com isso, os investimentos no Programa chegam a R$ 2.250.000,00 no Amazonas, sendo dois terços (R$ 1,5 milhão) do governo federal e um terço (R$ 750 mil) do governo do Estado.
O objetivo da equipe de José Albertino é inventariar a diversidade de insetos nas áreas de fronteira do Estado com os estados brasileiros e os países vizinhos. De acordo com o pesquisador, os insetos da Amazônia são pouco conhecidos pela Ciência. Há uma estimativa proporcional de aproximadamente 60 mil espécies conhecidas, mas o número de insetos pode ser quatro vezes maior. “Considerando que o número de espécies de insetos no mundo deve aumentar pelo menos em 4 vezes, o mesmo e provavelmente mais que isso deve ocorrer na Amazônia. Assim o número de espécies de insetos na Amazônia certamente será mais de 250 mil espécies quando a fauna estiver bem estudada”, disse Albertino. Isso significa que ainda há quase 200 mil espécies desconhecidas.
O conhecimento dos insetos, segundo o pesquisador José Albertino, é importante sobre o aspecto benéfico e maléfico ao homem. Benéfico porque há grupos que atuam na ciclagem de nutrientes, são fonte de proteínas para animais maiores como peixes e mamíferos e são importantes polinizadores das plantas. Maléfico porque alguns grupos são pragas de plantas que servem de alimento ao homem, porque há grupos que transmitem agentes patogênicos que causam doenças nos humanos e em outros animais.
Atualmente a área do Estado do Amazonas mais bem conhecida sob o aspecto da diversidade de insetos é a Reserva Florestal Adolpho Ducke, no município de Manaus, uma área de 10 mil hectares. “Esse fato, por si só, já é louvável porque conhecemos um pouco da diversidade do Estado. Mas não devemos nos contentar com tão pouco diante da imensidão ainda desconhecida, principalmente face à grandiosidade territorial do Estado”, afirmou José Albertino.
A primeira ação da equipe para o conhecimento do maior número de insetos implica no esforço científico para descobrir, descrever e quantificar as espécies, onde estão ou como se distribuem, sendo esta a pergunta mais difícil de responder porque necessita de estudos prévios. “Somente para a Reserva Ducke essa resposta é possível para alguns grupos bem estudados. É necessário que esta pergunta tenha resposta para todos os grupos taxonômicos e em todas as áreas”, afirma o pesquisador.
Os recursos da pesquisa também vão servir para aquisição de equipamentos, melhoria do acervo e da infra-estrutura da coleção científica do Inpa, “o maior e melhor depositário da fauna de insetos do Amazonas”, segundo José Albertino, e para a formação de recursos humanos. “Poderíamos enumerar vários outros motivos, relevância e importância, mas nenhum deles teria significância se não estivesse atrelado à formação de recursos humanos. Assim como as espécies transmitem sua carga genética para seus descendentes é importante que os taxonomistas passem seus conhecimentos para novas gerações de taxônomos”, argumenta o pesquisador.
O investimento na formação de novos pesquisadores da fauna de insetos é destacada como ponto essencial por José Albertino no projeto apresentado para seleção. Segundo ele, existem menos de 10 entomólogos taxonomistas, com emprego fixo, trabalhando nas principais instituições de ensino e pesquisa do Estado. “Este número é insignificante quando confrontado com a nossa riqueza de espécies e a extensão territorial. A permanecer este ritmo serão necessários mais de 500 anos para se chegar a um nível satisfatório do conhecimento da nossa entomofauna e, antes disso e no ritmo de destruição atual, grande parte estará extinta ou, no máximo, representada por alguns espécimes preservados em alguma coleção científica”.
Em entrevista ao Departamento de Comunicação da Fapeam, o pesquisador José Albertino Rafael defende com mais propriedade a importância do estudo dos insetos na Amazônia e esclarece como a equipe pretende atuar para desenvolver o trabalho.
ENTREVISTA
“O homem já foi à Lua em busca de vestígios de vida, mas ainda não conhece todos os organismos com os quais convive na terra”
José Albertino Rafael.
1) O seu é o segundo projeto aprovado para estudo de insetos no Amazonas (a pesquisadora Neusa Hamada vai estudar insetos aquáticos). Qual a importância do estudo dos insetos na Amazônia?
A Amazônia é a área mais diversa do planeta face a sua grande extensão territorial. Os insetos constituem o grupo de organismos mais diverso sobre a face da terra, constituindo cerca de 60% de todos os organismos conhecidos. Logo na Amazônia está localizada grande parte dessa diversidade de insetos. Por ser um grupo muito diverso ainda está muito pouco estudado e seu conhecimento está concentrado nas proximidades das grandes cidades (Belém e Manaus) e dos grandes rios amazônicos, face às facilidades de deslocamentos por meio de barcos. Por ser um grupo predominante sobre a terra ele é extremamente importante para o equilíbrio na natureza. São importantes sobre o aspecto benéfico e maléfico ao homem. Benéfico porque há grupos que atuam na ciclagem de nutrientes, são fonte de proteínas para animais maiores como peixes e mamíferos e são importantes polinizadores das plantas. Maléfico porque alguns grupos são pragas de plantas que servem de alimento ao homem, porque há grupos que transmitem agentes patogênicos que causam doenças nos humanos e em outros animais.
Na Amazônia os insetos de importância médica estão mais bem estudados. Os demais, face a grande diversidade, ainda precisam de muitos estudos e de muitos pesquisadores para estudá-los. O homem tem a obrigação de conhecer todos os organismos com os quais convive na natureza, conhecer sua função e sua importância. Todas as espécies têm um papel a desempenhar na natureza e são mais antigas do que o próprio homem, portanto, devemos, como seres denominados inteligentes, preservá-las na natureza.
2) O senhor e a maioria dos pesquisadores da equipe já desenvolvem trabalho nessa área e o plano de trabalho prevê aumento de 20% no número de insetos conhecidos. Fale um pouco do conhecimento já existente, principalmente no Inpa.
No mundo existem atualmente cerca de 925 mil espécies de insetos conhecidas. No Brasil, onde ocorre entre 10% e 15% da fauna mundial, há cerca de 115 mil espécies. Na Amazônia, que corresponde a 3/5 do território nacional, há a estimativa proporcional de aproximadamente 60 mil espécies conhecidas. Considerando que o número de espécies de insetos no mundo deve aumentar pelo menos em 4 vezes, o mesmo e provavelmente mais que isso deve ocorrer na Amazônia. Assim o número de espécies de insetos na Amazônia certamente será mais de 250 mil espécies quando a fauna estiver bem estudada. Isso significa que ainda temos quase 200 mil espécies (subestimativas) para conhecermos, para descrevermos cientificamente. Por conseguinte, ainda é necessário muito investimento, desde a formação de taxônomos que são os especialistas em identificar e descrever as espécies, até recursos financeiros para a coleta, a preservação e o armazenamento de todo o material testemunho utilizado nas pesquisas. Este projeto dará uma pequena parcela de contribuição ao conhecimento desta fauna, mas isso é um trabalho contínuo, que passa de geração a geração, e sempre haverá necessidade de novos recursos financeiros e novos especialistas capazes de identificar a nossa riqueza de espécies.
A estimativa do projeto é de incorporar entre 100 mil e 150 mil exemplares ao acervo da Coleção de Insetos do INPA, o que significa um acréscimo de mais de 20% do acervo atual. Este acréscimo só será possível com expedições de coleta que irão explorar áreas de difícil acesso, como as fronteiras do estado do Amazonas. Essas coletas são importantes porque pouco foi coletado nas áreas mais remotas do estado e sequer sabemos o que lá poderemos encontrar. Certamente muitas espécies ainda desconhecidas da ciência, as quais serão descritas por especialistas envolvidos no projeto e por outros, a serem contatados, para colaborar na identificação da fauna coletada.
Atualmente a fauna mais bem conhecida no Amazonas é aquela em que atuam os especialistas do INPA e da UFAM. E são poucos os grupos, concentrados em besouros e moscas, face a pouca quantidade de especialistas. Precisamos mostrar ao mundo a nossa riqueza para que a mesma possa ser explorada de maneira racional e em benefício da qualidade do ser humano.
3) O trabalho de coleta de insetos vai ser feito em todo o estado do Amazonas ou haverá uma área ou região em que o estudo se concentrará?
O aporte de recursos permitirá coletas em áreas fronteiriças do estado. Os rios que fazem fronteiras com o estado do Pará e com os países vizinhos serão explorados com frete de embarcações regionais. Estamos mantendo contato preliminar com o Exército e a Aeronáutica para termos apoio de transporte e podermos acessar às áreas de fronteira seca com outros países, principalmente no norte do Estado.
4) O senhor diz no projeto que o número de espécies de insetos no mundo deve triplicar e no Amazonas quadruplicar, o que justificaria o estudo para conhecimento dessas novas espécies. Como ocorre o aparecimento de novas espécies? De onde vêm?
Como dito acima, na Amazônia o número de espécies deve quadruplicar e isso é uma sensata, ponderada (Há especialistas que dizem que o número de espécies deve crescer cerca de 30 vezes). No Amazonas há a mesma estimativa e acredito que seja até maior porque nossa fauna ainda é muito pouca estudada. As espécies já ocorrem nas suas áreas de distribuição, mas o homem ainda não as conhece porque ainda não foram coletadas. Daí a necessidade de expedições científicas para as coletas em diferentes áreas, com diferentes métodos de coletas, em diferentes épocas do ano e em diferentes estações. O homem já foi à lua em busca de vestígios de vida, mas ainda não conhece todos os organismos com os quais convive na terra. Estes organismos, conhecidos ou ainda desconhecidos, podem ter substâncias importantes para a cura de doenças, para a aplicação em biotecnologia e outros aplicações em benefício da qualidade de vida do ser humano. É importante que para melhorar a qualidade de vida do ser humano seja imprescindível preservar a qualidade de vida de todos os outros organismos. Afinal, se somos seres inteligentes, não podemos ser egoístas.
Obs: as espécies não aparecem: elas já existem na natureza, nas suas áreas de distribuição, por força da evolução de bilhões de anos. O homem é que ainda não conhece todas as espécies e paulatinamente vai conhecendo, descrevendo-as.
5) O senhor diz que tem uma motivação especial: o estudo dos nossos carapanãs (culicídeos), um grupo de interesse médico. Esse é um grupo que recebe novas espécies ou o conhecimento das espécies é precário no Amazonas?
O conhecimento dos carapanãs ainda não é satisfatório e por isso há especialistas taxônomos para identificar e descrever espécies ainda desconhecidas. Apenas as espécies antropofílicas (que atacam o homem) e transmissoras de agentes patogênicos que causam malária, dengue, leishmaniose estão bem estudadas. As espécies silvestres e que podem se tornar antropofílicas face às alterações ambientais causadas pelo homem ainda precisam de estudos taxonômicos adicionais porque são importantes transmissoras de diferentes tipos de arbovirus que causam doenças ainda desconhecidas.
6) Em que sentido o grupo dos carapanãs é de interesse médico? Justifico a pergunta: as doenças conhecidas e estudadas (inclusive os vetores) podem ser transmitidas por outras espécies de carapanãs?
Valmir Lima – Decon/Fapeam
Foto gentilmente cedida pelo Dr. José Albertino Rafael