Estudantes aprendem sobre ciência interagindo com animais na floresta


Imagine poder ensinar estudantes da 1ª a 8ª série um pouco da história natural das espécies de animais que vivem na Amazônia de maneira prática e divertida. Essa é a fórmula desenvolvida pela equipe do projeto “Biólogos aprendizes: entendendo e apreciando a biodiversidade amazônica”, finalizado ano passado no âmbito do Programa Jovem Cientista Amazônida (JCA), da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Amazonas (Fapeam).
De acordo com a doutora Albertina Lima, coordenadora do projeto e pesquisadora do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa), a proposta era incluir estudantes da rede pública de ensino no universo científico, disponibilizando informações sobre a herpetofauna, animais pouco conhecidos, porém diversos no meio ambiente. Esse grupo é formado por cobras, sapos e lagartos. A proximidade com a natureza foi um dos pré-requisitos adotados no processo de escolha da unidade escolar a receber os trabalhos.

“O trabalho foi realizado pela aluna de doutorado Maria Goretti Pinto com estudantes da Escola Municipal Abílio Alencar, que fica localizada próximo à Reserva Adolpho Ducke, que foi a sede das nossas atividades de campo. Eles já eram familiarizados com a floresta, portanto não tivemos problemas quanto ao manejo dos animais. Todos mostravam-se bastante interessados”, revela Lima.

Para a pesquisadora, mobilizar esse público é estratégico. Primeiro porque tratam-se de crianças e formar uma consciência ambiental em uma geração ainda em desenvolvimento gera resultados mais significantes e intrínsecos. Segundo porque essas pessoas vivem na área da Reserva, o que as torna responsáveis indiretas por sua preservação. Se elas percebem que esses conceitos se adequam a suas vidas, comunidade e meio ambiente só têm a ganhar.

Em média, foram realizadas três excursões à Reserva, onde os estudantes tiveram a oportunidade de conhecer a floresta por meio do sistema de trilhas do Programa de Pesquisa em Biodiversidade (PPBio), do Ministério da Ciência e Tecnologia (MCT).

Além da coordenadora e a estudante de doutorado, faziam parte do projeto 12 bolsistas de JCA (na faixa etária de 13 a 18 anos), um apoio técnico e um professor da escola.

 

A ordem é explorar – O trabalho com o estudantes foi dividido em dois módulos, ambos realizados na Reserva. Como informou Lima, o treino inicial limitava-se a aprender os procedimentos básicos a serem realizados no campo, principalmente, a “arte” de coletar os animais.

“O interessante é que apesar deles viverem perto da Reserva eles não conheciam os animais. Revelá-los foi misto de admiração e curiosidade”, salienta Lima.

A segunda fase era mais elaborada. Cada grupo de estudante precisava aplicar uma fórmula para medir o índice de diversidade do ambiente. Eles precisavam responder as seguintes questões: quantos animais são encontrados em uma dada extensão territorial? Quais espécies são mais diversas?

Mesclando esses dados matemáticos aos conhecimentos históricos e científicos referentes a cada animal, os estudantes puderam compreender como funciona a dinâmica de interação entre os ecossistemas terrestres. Nesse processo, as cobras e o efeito do veneno de algumas delas foram temáticas que causaram um verdadeiro “frisson” nos jovens.

“O ofidismo gerou um grande interesse nos estudantes. Muitos buscaram obter mais conhecimentos sobre as formas de identificar as cobras peçonhentas. Isso revela uma forte preocupação até mesmo com o bem-estar de suas famílias e de si mesmo”, ressalta a pesquisadora.

A compilação dos dados foi reunida em uma cartilha, produzida em um formato de guia, na qual são apresentados, por meio de imagens, as espécies coletadas e estudadas.  

“O primeiro passo era mostrar e revelar alguns animais ainda desconhecidos pelos alunos, ajudando-os, quando necessário, a diferenciá-los de outros. Depois, cada um era nominado cientificamente, de modo que os bolsistas pudessem conhecer tanto a nomenclatura popular quanto científica”, explica Lima. Para ela, os livros de ciências aplicados em sala de aula não fomentam a inclusão científica da sociedade, principalmente no que tange o debate sobre as questões amazônicas. “Nossas escolas não suprem essa necessidade de conhecimento local. A ciência apresentada nas aulas é importada”, afirma.

Engajados na proposta de integrar o ambiente escolar aos resultados das atividades do projeto, os bolsistas fizeram uma exposição final perante todos os outros estudantes do colégio, destacando todo o aprendizado acumulado durante a experiência. Além disso, o grupo também representou o projeto durante a mostra de trabalhos do JCA, ano passado.

 Dando continuidade à ação – É proposta do grupo de pesquisa da Dra. Albertina montar um projeto multidisplicinar, a ser submetido ao Programa de Apoio a Núcleos de Excelência em Ciência e Tecnologia (Pronex/Fapeam), destinado a treinar várias comunidades que vivem ao longo da BR-319 a usufruírem dos potenciais benefícios que surgirem com o crescimento do ecoturismo naquela área.

“Essas pessoas não estão preparadas para serem guias de possíveis turistas interessados em conhecer a biodiversidade daquela região. E não poderemos desconsiderar essa atividade como uma forma de geração de renda para essas comunidades, só que de uma forma consciente, sem agredir o meio ambiente”, diz Lima.

Além disso, segundo a pesquisadora, é fundamental para a comunidade científica conhecer com mais detalhes a diversidade biológica ao longo da BR. Portanto, são duas frentes de ação: a primeira é a geração de dados sobre a variação da diversidade dos animais e a segunda é a capacitação de lideranças comunitárias para atuação como guias, ajudando a formar (no casos dos adultos) e a perpetuar (envolvendo os jovens) princípios de conservação ambiental.

“Estamos pensando em solicitar para esse projeto aproximadamente 90 bolsas, de diversos níveis. A idéia é realizar vários cursos envolvendo grupos de pesquisadores de diferentes áreas. Também pretendemos criar 11 módulos ao longo da BR”, revela.

De acordo com ela, pouco se sabe sobre a região cortada pela BR que, geograficamente, trata-se de uma área de transição entre várzea e terra firme. A realização de um inventário biológico é uma necessidade eminente. No âmbito de ações de outros projetos, a pesquisadora e sua equipe tiveram a oportunidade de descrever quatro novas espécies de sapos, todas de um único gênero, o (Colostethus, família: Dendrobatidae. “Isso porque é fruto de um estudo pontual, imagine num estudo macro”, finaliza.

 

Grace Soares – Decon/Fapeam

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