Ações envolvendo tecnologia social no Amazonas têm apoio do MCT
Os pesquisadores estiveram nas comunidades de Nossa Senhora das Graças, Bom Jesus do Paraná de Iauara e Santo Antônio. Em todas elas, a nova tecnologia que vai mudar o processo produtivo das fibras foi recebida com grande entusiasmo. No atual processo, quando o rio começa a encher, os produtores têm que colher a produção o mais rápido possível. Inicia-se uma fase muito cansativa e perigosa, em que é preciso deixar as hastes da malva e da juta de molho por um período de seis a 15 dias, para que estas amoleçam e possam ser maceradas, descortiçadas e desfibradas manualmente.
– Passamos o dia dentro água e agora poderemos trabalhar no enxuto, levando a fibra para a água só na hora de lavar, o que pode ser feito até dentro de um tanque. A máquina vai livrar a gente de muitas doenças e nos dará mais tempo pra plantar outras coisas também, pois quando a água vem subindo, a gente fica num “aperreio medonho”, ou colhemos rápido ou perdemos toda a produção, contou o agricultor José Francisco Guedes de Souza, morador de Santo Antônio que trabalha com a malva há seis anos.
– Praticamente já nascemos trabalhando com a agricultura, e poder sair da água será uma grande benção. Ficar horas de molho é doloroso e penoso para as mulheres. As unhas só não amolecem porque são uma criação divina perfeita, comentou Maria Socorro Vieira da Silva, que trabalha há 14 anos com a malva e é uma das muitas mulheres que trabalham com o árduo cultivo da fibra nas comunidades.
Segundo Prof. Dr. Carlos Moises Medeiros, engenheiro agrícola da Universidade Federal do Amazonas e pesquisador da área de Socioeconomia do Piatam, a malva é uma cultura lenhosa cuja fibra encontra-se em sua casca. Assim, o equipamento tem a função de separar o lenho da planta de seu revestimento fibroso.
– Sabendo desse princípio, nos inspiramos em outros equipamentos usados em culturas semelhantes. Como a máquina precisava de adaptações, tivemos a idéia de promover melhorias desenvolvendo-a em conjunto com os produtores que são os seus verdadeiros donos. Com isso, eles se sentem mais próximos do equipamento, dando mais valor a ele. Na minha opinião, essa é a parte do projeto que melhor garantirá a sustentabilidade da ação, completou o professor, que também participou da excursão.
As alternativas para o desenvolvimento agrícola e social nas nove comunidades situadas na área de pesquisa do Piatam surgiram em 2005 e são feitas com base nos estudos de extensão rural realizados ao longo dos sete anos de execução do projeto. Entre essas ações, que incluem oficinas de capacitação de liderança e o desenvolvimento de hortas comunitárias, estão previstas atividades que priorizam melhorias no processamento da malva e da juta para comercialização.
– Ao identificarmos essas dificuldades, tentamos buscar inovações tecnológicas que pudessem romper certas práticas da cadeia produtiva, substituindo o esforço subumano exigido no processo. As seis máquinas distribuídas durante a viagem foram financiadas pelo Ministério da Ciência e Tecnologia e exercerão um importante papel no processo produtivo dessas culturas, trazendo inúmeros benefícios à produção e diminuindo os danos à saúde dessas pessoas, comentou Therezinha Fraxe, doutora em Sociologia e coordenadora da área de Socioeconomia do Piatam.
A pesquisadora explica, no entanto, que nenhum projeto realizado em comunidades ribeirinhas pode se dizer sustentável se não trabalhar a questão de sua estruturação social. Por isso, a disponibilização da máquina não se configura como uma doação, pressupondo uma contrapartida por parte dos agricultores os quais terão que cumprir indicadores sociais relacionados à organização social (a partir da legalização das associações e da construção de sedes comunitárias), à saúde (garantindo a vacinação, a diminuição do índice de verminoses nas crianças e a realização periódica do exame preventivo para as mulheres) e à educação (considerando a inclusão das crianças na escola e a diminuição do índice de evasão e repetência). Além disso, os produtores também foram orientados, por meio de uma oficina de capacitação em administração rural, a trabalharem a organização do gerenciamento da propriedade e da produção, tanto individuais, como as comunitárias.
Após acompanhar as atividades do projeto, Leonardo Hamú classificou o equipamento como uma tecnologia social. Para ele, acompanhar os trabalhos propiciou uma percepção mais precisa do modo de vida dessas populações tradicionais, capacitando-o a avaliar com mais propriedade tanto as futuras propostas, como a execução do projeto financiado pelo MCT.
– Tivemos a oportunidade de vivenciar o método tradicional de colheita e manejo da fibra e vislumbrar de que forma a máquina poderá melhorar e influenciar a vida dessas pessoas. Entendo que é necessário que esses projetos jamais sejam interrompidos. Assim, garantir o fluxo de recursos por parte do Governo Federal é de fundamental importância para garantir a continuidade e sustentabilidade das ações, completou.