Amazônia: Americanos são líderes da invasão estrangeira
Augusto Nunes escreve para a “Gazeta Mercantil”:
Os índios do Brasil profundo aprenderam há quase 400 anos que a cobiça é perigosamente aguçada quando abundam, na superfície e no subsolo da imensidão semideserta, riquezas naturais de dimensões espantosas.
Os homens que, a partir do século 17, resolveram enfurnar-se por lonjuras intocadas buscavam mais que terra e prazeres. Buscavam terra e fortuna.
A tribo dos brasileiros não aprendeu com os antepassados. Se não desdenhassem das lições dos velhos caraíbas, a Amazônia teria sido efetivamente ocupada há muito tempo, com racionalidade, imaginação e eficácia.
Faltam atenções dos governos. Falta vigilância nas fronteiras. Falta gente (a densidade populacional é a mais raquítica do país).
A Amazônia continua tão vulnerável a invasores, oportunistas e aventureiros como no dia em que o primeiro homem branco penetrou na selva.
Numerosos países, dezenas de entidades internacionais e organizações não-governamentais contemplam com crescente cupidez a imensa usina de superlativos.
A Amazônia brasileira é uma demasia de jazidas minerais, pedras preciosas, madeira de lei, plantas medicinais raríssimas. Ali está a maior floresta tropical do mundo.
Os rios do lugar compõem a maior das bacias fluviais, que concentra 20% da água doce disponível num planeta cada vez mais sedento.
Pois o Brasil segue encarando com desdém a hipótese de perder o controle sobre a região que soma mais da metade do território nacional. Só recentemente o ex-ministro Delfim Netto aposentou a certeza de que um Brasil sem a Amazônia é tão improvável quanto o Rio sem Carnaval.
"Sempre achei que era coisa de paranóico", conta Delfim. "Já não penso assim. Se não ocuparmos a Amazônia, os estrangeiros farão isso", diz ele. Avisos nunca faltaram.
Em 1981, o Conselho Mundial das Igrejas declarou a Amazônia "um patrimônio da Humanidade, cuja posse por países é meramente circunstancial". Em 1983, a primeira-ministra inglesa Margareth Thatcher sugeriu às nações carentes que vendessem "fábricas e territórios".
Em 1984, o vice-presidente americano Al Gore optou pelo recado sem rodeios: "A Amazônia não é dos brasileiros. É de todos nós."
Os governantes da nação agredida pelas sucessivas ameaças reagiram com a placidez de quem acredita mesmo que Deus é brasileiro – e jamais faltará aos conterrâneos na hora difícil. E as provocações prosseguiram.
"O Brasil deve aceitar a soberania relativa sobre a Amazônia", informou em 1985 o francês François Mitterrand.
Estimulado pela adesão de Mikhail Gorbachev, líder da falecida União Soviética, o primeiro-ministro inglês John Major admitiu a execução de "operações diretas" no norte do Brasil.
E o general americano Patrick Hughes rascunhou a declaração de guerra: "Caso os brasileiros façam da Amazônia uma ameaça ao meio ambiente nos EUA, estaremos prontos para agir."
Liderados pelos EUA, países estrangeiros passaram há muitos anos da palavra à ação, vêm reiterando relatórios confidenciais produzidos anualmente pelo Grupo de Trabalho da Amazônia.
Coordenado pela Agência Brasileira de Inteligência (Abin), o GTAM reúne especialistas em assuntos amazônicos ligados aos serviços de inteligência das Forças Armadas e da Polícia Federal. O relatório de 2005 é inquietante. O de 2006, ainda mais perturbador.
Publicado com exclusividade pela Gazeta Mercantil e o Jornal do Brasil, o mais recente estudo do GTAM concentra-se em nove questões que os especialistas consideram especialmente relevantes.
Condena a demarcação contínua da Reserva Indígena Raposa Serra do Sol, radiografa a questão ambiental, denuncia a ação do crime organizado e trata dos conflitos fundiários.
O tom, sempre incisivo, torna-se áspero no capítulo dedicado à ação do governo. Ou omissão: a máquina do Estado ainda não chegou lá.
Nenhuma novidade: o último presidente a incursionar demoradamente pela Amazônia foi o americano Theodore Roosevelt. Em 1914.