Publicação registra estudo sobre modo de falar de amazonenses
29/03/2012 – A diversidade cultural do homem amazônico no âmbito linguístico pode ser encontrada agora em uma obra literária. O livro, fruto de uma tese de doutorado em Letras na área de Estudos Linguísticos, foi concretizado por meio do Programa de Apoio a Publicações Científicas (Biblos) da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Amazonas (FAPEAM).
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‘O alçamento das vogais posteriores em sílaba tônica: um estudo do português falado em Borba no Amazonas’ é o título do trabalho da professora do Departamento de Comunicação Social da Universidade Federal do Amazonas (Ufam), Maria Sandra Campos, no qual são apontadas a variação do fonema como um fenômeno bastante intrigante, mas, ao mesmo tempo, enriquecedor do ponto de vista linguístico.
A elevação de uma vogal para outra mais elevada, por exemplo /o/ para /u/, é chamada de alçamento. O fenômeno passaria despercebido se não fosse a frequência do seu uso. Segundo a pesquisadora o alçamento é fartamente recorrente em ambiente átono e tendência geral do português. “A exemplo disso, temos: menin[u] em vez de menin[o], etc. Intrigantemente, na zona rural de Borba, ocorre em ambiente tônico: can[u]a em vez de can[o]a, etc”, exemplificou Campos.
A pesquisadora observou a prática do fenômeno de alçamento presente em 15 comunidades rurais do município de Borba, localizado a 151 quilômetros ao sul de Manaus. O estudo possibilitou o vislumbramento de uma pesquisa mais consistente e abrangente, por meio da qual pôde ser realizado o mapeamento fonético e a descrição mais apurada da língua falada em todo o Estado do Amazonas.
“Essa iniciativa se deu a partir do município de Borba em razão do fenômeno ser natural naquela região, privilegiando-a como ponto de partida para um estudo mais geral sobre os fenômenos linguísticos e sua contribuição para a formação cultural amazonense”, destacou.
Variação linguística
Segundo a pesquisadora, existem vários fatores relevantes para que essa variação linguística tenha ocorrido no Amazonas. O primeiro deles, chamado de geográfico, são os caminhos percorridos pelos falantes, os quais vão disseminando a língua. A presença do colonizador português em vários contextos é um exemplo disso.
Outro fator, desta vez de cunho social, é o grau de escolaridade, que mensura a fala no seu estágio genuíno, ainda protegido da influência da escola. O fenômeno do alçamento na região já atingiu grandes proporções, foi recorrente em todas as faixas etárias chegando à sede do município. As grandes distâncias que separaram as comunidades dos grandes centros de ebulição linguística, por exemplo, da capital do Estado, também contribuíram para conservar o fenômeno nesses locais.
“Borba teve uma forte influência portuguesa durante o processo de colonização da região amazônica, principalmente, quando ocorreu a vinda de casais açorianos para povoar a Região, informação já confirmada pelas considerações do estudioso da língua portuguesa Serafim da Silva Neto”, ressaltou Campos.
Riqueza Cultural
Tendenciosa em dizer que o fenômeno é uma influência portuguesa e não indígena como querem os preconceituosos, a pesquisadora se afasta cada vez mais dessa hipótese, enveredando para o campo da Sociolinguística, que valoriza os falares e seus falantes, distanciando-se do rançoso preconceito que se abateu sobre o caboclo.
“Apesar da maioria das pessoas estabelecer preconceitos sobre a fala do ribeirinho, o fenômeno do alçamento representa uma variante regional rica em detalhes e peculiaridades. Por conta da falta de acessibilidade à riqueza cultural, muitos nem percebem que esse modo de falar diferente traz um legado linguístico riquíssimo, e que, por conta da discriminação, vem perdendo espaço para ‘um bem falar’ determinado pela dominação social, explicou a pesquisadora.
Campos destaca por meio do livro que o caboclo se recente e se retrai na sua fala, pois, o fenômeno muitas vezes é motivo de gozação “Nós, amazonenses, fazemos a distinção, a discriminação e o preconceito pelo fato de estar associado à descendência indígena, vinculado ao processo histórico que se deu durante o colonialismo português. Infelizmente o nosso caboclo carrega esse fardo se retraindo para o mundo”, finalizou.
Sobre o Biblos
O Programa de Apoio a Publicações Científicas (Biblos) consiste em apoiar a publicação de livros, manuais, números especiais (temáticos) de revistas e coletâneas científicas nos seguintes suportes: papel, mídia eletrônica e digital.
Foto 1 – Maria Sandra Campos (Reprodução)
Foto 2 – Capa do livro (Reprodução/Ufam)
Sebastião Alves – Agência FAPEAM