A Escola faz ciência
Um dia fiz funcionar, num cantinho da pequena cozinha de minha casa, uma máquina a vapor. A geringonça constava de uma lata de leite Ninho cheia de água e hermeticamente fechada, sobre um fogareiro, a qual se conectava à extremidade de uma mangueirinha de soro, que, por sua vez, tinha sua outra extremidade conectada a uma seringa de injeção de vidro. Ao êmbolo da seringa era ligada uma haste de metal levemente arqueada e presa à lateral de uma roda de madeira, com uns quarenta centímetros de diâmetro, fixada ao eixo central por um velho rolamento encontrado no quintal de uma oficina. O princípio era o seguinte: ao atingir o ponto de fervura, a água gerava a pressão, que corria ao longo da mangueirinha, que empurrava o êmbolo, que deslocava a haste e que girava a roda de madeira num movimento alegre e cadenciado misturado a um barulhinho característico, semelhante aos trens dos velhos filmes de faroeste assistidos aos domingos nas matinês do cine Ideal. A minha maravilhosa geringonça funcionava por apenas dois ou três minutos, até o aquecimento estourar a mangueirinha de plástico, mas para mim era uma eternidade que satisfazia plenamente o meu espírito infantil e inventivo. Eu estava fazendo ciência e não sabia. Aquela reinvenção da máquina a vapor e tantas outras esquisitices de pequeno cientista maluco, perdidas no tempo e quase na memória, resgato-as agora em função do Programa Ciência na Escola – PCE, lançado pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Amazonas em parceria com a Seduc e a Semed. Nada mais empolgante do que, já no ensino fundamental, abrir caminhos para que crianças sejam estimuladas a pôr sua imaginação à prova, comprando desafios e descobrindo as potencialidades de seu talento, muitas vezes apagado pela burocracia pedagógica, que privilegia a circularidade da repetição e sufoca a criatividade. E isso numa dimensão muito maior, porque há também o envolvimento do professor das duas redes públicas, responsável pela feitura do projeto e pelo desenvolvimento da pesquisa, com acompanhamento rigoroso feito por um comitê de especialistas. Associe-se ainda à novidade o fato de que os jovens estudantes cientistas selecionados perceberão, durante os oito meses de duração do projeto, uma bolsa de estudos no valor de cento e vinte reais, o que dá ao programa uma importante vertente de inclusão social pela ciência. Para um país e, particularmente, um Estado que necessita desesperadamente formar massa crítica altamente qualificada, trata-se de uma iniciativa que mira no presente mas acerta de cheio no futuro.
Fonte: www.odenildosena.info