A língua que a gente fala


A língua faz parte do processo de afirmação da identidade de um povo. Com ela, podemos nos expressar, seja na forma de emoções seja na forma de sentimentos, afinal, quanto mais nos inteiramos de nossa língua mais nos aproximamos e entendemos a nós mesmos e aos outros.

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Autor de “Amazonês: expressões e termos usados no Amazonas”, Sérgio Freire, doutor em Linguística pela Universidade Estadual de Campinas  (Unicamp), falou em entrevista a agência FAPEAM sobre a língua falada no Amazonas. Fala também sobre a obra,  na qual lista mais de 1.500 expressões do vocabulário dos amazonenses.

“A linguagem deve ser área estratégica de C&TI. Ela mediatiza as relações sociais e organiza os processos sociais. Pesquisar essa área é não uma necessidade, mas uma necessidade urgente”, disse o professor Sérgio Freire.

Sérgio Freire (Foto: Divulgação)

Sérgio Freire (Foto: Divulgação)

 Agência Fapeam – O que é a língua?

Sérgio Freire – Língua é identidade. Pela língua nós nos identificamos e nos desidentificamos. Quando aprendemos uma língua, aprendemos com ela um mundo, valores, cultura. E por ela e com ela fazemos as transformações sociais.

AF  – Porque escrever um livro sobre as expressões usadas no Amazonas?

Sérgio Freire – O trabalho do linguista é descrever, explicitar. Não é um trabalho valorativo no sentido de dizer o que é certo ou o que é errado. É um trabalho no sentido de dizer o que é. Há muito precisávamos registrar a identidade amazonense na linguagem.

AF  – Qual o direcionamento e quais as fontes utilizadas?

Sérgio Freire – O trabalho levou dez anos entre a sua concepção e sua publicação. Foram utilizadas fontes primárias de sujeitos falantes do português oralizado de várias regiões do Estado.

AF  – Como foi o processo de produção, pesquisas e captação de informações para o livro?

Sérgio Freire – Primeiramente foi definido o escopo: a oralidade. Depois, gravações em áudio e vídeo foram feitas e analisadas. Um terceiro momento envolveu o tratamento linguístico dos dados por meio dos estudos de terminologia. O resultado de tudo isso é o dicionário.

AF  – Qual a contribuição desta sua obra para a sociedade?

Sérgio Freire – Uma pesquisa vem do social e para o social deve voltar. Registrar a lingual oral amazonense em um instrumento linguístico como o dicionário é participar de uma política linguística de valorização da língua e da identidade. Colocar a linguagem em pauta é a grande contribuição.

AF  – Quais as dificuldades encontradas durante o processo até a publicação do livro?

Sérgio Freire – Acesso aos dados. Fazer pesquisa no Amazonas tem suas particularidades.

AF  – Todas as expressões do livro são somente usadas no Amazonas, ou o senhor também usou expressões de outras regiões?

Sérgio Freire – O dicionário não é um livro de cartório. As expressões e termos que lá estão, estão porque são usados aqui. Pelo próprio caráter dinâmico da língua, sua movência e seus contatos, há muitos termos utilizados em outros lugares também. O dicionário é de termos usados no Amazonas, mas não necessariamente só aqui.

AF  – O livro foi bem aceito? Em qual edição está e há projetos para uma nova edição?

Sérgio Freire – Muito bem aceito. Desde seu lançamento, em 2010, tem sido o livro regional mais vendido. Está na segunda edição e há uma terceira edição no prelo.

AF  – Onde a sociedade pode encontrar este livro e qual diferencial o senhor usou para chamar a atenção do leitor?

Sérgio Freire – O livro pode ser encontrado nas livrarias da cidade. O diferencial, penso, está no caráter lúdico dos exemplos dos verbetes.

AF  – Como é ser escritor no Amazonas? E quais seus próximos projetos?

Sérgio Freire – Não é fácil. Não temos uma cultura leitora, apesar de ter muita gente que lê. Mas um escritor não escolhe público. O público o escolhe. Estou trabalhando em um livro sobre a história do ensino de línguas estrangeiras no Brasil, aproveitando boa parte da minha pesquisa que fiz para o meu doutorado, que defendi em 2005.

AF  – Nossa herança fonológica é muito diversificada, de que forma essa diversidade cultural influenciou nossa formação linguística?

Sérgio Freire – No que tange aos sons, temos um mix do português europeu e do português nordestino. Deu numa fonética rica e interessante.

AF  – Porque ainda há e como extinguir o preconceito existente quanto à diversidade de dialetos em cada região do País?

Sérgio Freire – Tudo decorre do conceito de língua. Se compreendermos língua como sinônimo do registro padrão – que é importante porque é a norma de investimento social – cairemos na noção de que tudo que dele foge é erro ou menos língua. É preciso pensar língua de forma mais rica, como o conjunto de variedades existentes, com uma de prestígio. Mudar o conceito é fundamental para diminuir o preconceito linguístico.

Maxcilene Azevedo – Agência FAPEAM

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