Cheia recorde no Amazonas é causada pelo fenômeno La Niña


04/06/2012 – Uma série de três reportagens, elaboradas pela Agência FAPEAM, vai abordar os fenômenos da cheia e da vazante no Estado do Amazonas, destacando as consequências e as interferências das mudanças do nível das águas para o meio ambiente e para as populações que vivem na região. Confira a seguir, a primeira parte. Boa leitura.

Parte I

Informações divulgadas, no dia 12 de março de 2012, pelo Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa/MCTI) e pelo Instituto Max Planck de Química (MPIC) indicavam que o Amazonas iria passar por uma cheia recorde este ano. A estimativa era de que as águas atingissem o nível de 29,67m (margem de erro de 29,29-30,05 m), apenas 10 cm abaixo que a maior cheia já registrada em 2009 (29,77m). A previsão foi fortalecida pelo Serviço Geológico do Brasil (CPRM) no dia 31 de março, o qual previu uma cheia de 30,13 m (margem de erro de 40 cm).

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Com base nas informações, os pesquisadores do Inpa e do CPRM sabiam desde o segundo semestre de 2011 que choveria acima da média. Contudo, conforme o pesquisador do Inpa, Antônio Manzi, isso não significa recorde ou extrema, pois são previsões com base na cota do Rio Negro no Porto de Manaus, o qual não é influenciado pelo que acontece em toda a bacia do Rio Solimões. Além disso, sempre há erros médios, em torno de 40 cm, dependendo do modelo usado.

src=https://www.fapeam.am.gov.br/arquivos/imagens/imgeditor/amazzz.jpgConforme Manzi, uma das prováveis causas para a cheia recorde de 2012 foi o fenômeno climático La niña. Por isso, os pesquisadores que participam do grupo estão avaliando o tipo, o período em que apareceu e como o fenômeno evoluiu. Também estão fazendo análises de distribuição de temperatura dos oceanos Atlântico e Pacífico, a influência da massa de água sobre as sub-bacias do Rio Negro e Solimões e os valores mensais de chuva, a partir de 1996.

Doutor em Física da Atmosfera pela Universidade Paul Sabatier (Toulouse III), França, Manzi explicou que quando se estuda o clima existem muitas variáveis. Isso se deve ao fato, por exemplo, de que já ocorreram outras La niñas que não chegaram a provocar cheias tão intensas no Amazonas.

"Estamos estudando várias questões. Uma delas é a vazante de 2010 – período em que foi registrada a cota mais baixa nos últimos 110 anos no Porto de Manaus. Em 2010 e 2011 houve a maior variação do rio entre os valores mínimo e o máximo registrados, o qual foi de 15 metros. Isso é quase 50% da média histórica, que é de 10,10 metros. São quase 5 metros acima. Esse ano, o rio já encheu 12,60 metros. Significa que a cheia desse ano envolve não somente configurações específicas de temperatura dos oceanos, mas está associado ao regime hidrológico de chuva. Ainda não temos uma resposta final”, salientou.

Os pesquisadores também estão avaliando o histórico dos últimos anos de estoque de água nas bacias e sub-bacias do Rio Amazonas, especialmente, as sub-bacias dos rios Solimões e Negro.

Efeito La Niña

Conforme Manzi, a maioria dos fenômenos La niñas está associada ao aumento das chuvas em boa parte da Amazônia, sendo um sinal estatístico forte. Ele pontuou que nem todas têm a mesma configuração. Isto é, elas podem ser divididas em quatro tipos, do ponto de vista climatológico. Os tipos 1 e 2 ocorrem próximos da Costa da América do Sul (Oeste), enquanto os 3 e 4 na parte central do Oceano Pacífico (Leste). Entretanto, dependendo da época do ano elas podem ser mais ou menos fortes.  “Tivemos La niñas muito fortes no início e durante a primeira metade da estação chuvosa. O efeito é a produção de quantidades de chuvas mais fortes”, salientou.

src=https://www.fapeam.am.gov.br/arquivos/imagens/imgeditor/SITE_CHEIA%20AMAZONAS_001.jpgAs La niñas aconteceram durante todo o segundo semestre do ano passado, afetando o período chuvoso. Nos meses de outubro, novembro e dezembro, enfraqueceram. Todavia, ainda havia La niñas 3 e 4 atuando até o mês de abril de 2012, embora fracas. “Além desses fenômenos existem outros, mas ainda estamos avaliando. Não é possível divulgar agora”, lamentou e acrescentou que tiveram La niñas praticamente em quase todos os setores, principalmente no segundo semestre do ano passado.  

Cheia e secas intensas

Conforme o pesquisador, não se pode dizer com certeza se as cheias e as secas são uma consequência da variabilidade natural do clima ou se estão sendo afetadas pelas mudanças climáticas globais.

Mas, segundo o pesquisador, espera-se que haja a intensificação da variabilidade natural do clima. Significa que os anos mais frios e mais quentes podem se tornar mais frequentes. Da mesma forma, os períodos secos e chuvosos, com tempestades mais severas. "O que está acontecendo, em principio, poderia ser justificado pelas mudanças climáticas globais, mas não conhecemos muito bem a variabilidade natural do clima. Isso se deve ao fato de que há escalas de variação interanuais, decadais e seculares. Mas é provável que as mudanças climáticas estejam atuando”, explicou Manzi.

Segundo ele, se haverá nos próximos anos eventos extremos, não dá para dizer no momento. O certo é que os pesquisadores têm observado nos últimos 25 anos tendências de aumento de cheias e vazantes. Manzi disse que a série de acompanhamento que existe hoje é importante. Contudo, se tivessem medidas de outros séculos, haveria mais confiança nas análises, pois a série é curta do ponto de vista climático, mas foram registrados anos extremamente secos, como em 1923 e 1963. 

Luís Mansuêto – Agência FAPEAM

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