Conhecimento tradicional contribui para novo método de pesquisa para captura de pacas na Amazônia


 Método foi desenvolvido a partir da adaptação e padronização científica da técnica executada por moradores locais, e realizado com aporte dos conhecimentos tradicionais de caça para subsistência na Amazônia

Conhecimento tradicional contribui para novo método de pesquisa para captura de pacas na Amazônia

A pesquisa científica sobre aspectos biológicos e ecológicos de animais silvestres apresenta um desafio: a detecção e captura desses animais em ambiente natural. Na Reserva de Desenvolvimento Sustentável Amanã, no Amazonas, pesquisadores do Instituto Mamirauá encontraram uma técnica eficiente para a captura de pacas (Cuniculus paca), com a colaboração dos moradores de comunidades locais. O método foi descrito em artigo divulgado recentemente na revista científica internacional Wildlife Biology.

Hani Bizri, pesquisador do Instituto Mamirauá, unidade de pesquisa do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação, destaca que a maioria das informações biológicas conhecidas sobre as pacas vem do estudo em cativeiro. De acordo com o pesquisador, a falta de métodos apropriados para captura dos animais, dificulta a coleta de dados científicos que possam auxiliar no desenvolvimento de estratégias de conservação.

A paca é um roedor de grande porte que pesa, em média, oito quilos. “Apesar do seu tamanho, existe uma grande dificuldade de se obter dados científicos sobre a espécie, pois é um animal estritamente noturno, bastante elusivo e que vive em buracos na terra”, explicou Hani.

“A partir da captura, podemos, por exemplo, usar radiocolares para monitorar o deslocamento dos indivíduos, podemos obter amostras de sangue, pelo e pele para pesquisas sobre zoonoses e reprodução”, contou Hani. Após a captura para a coleta de dados, os animais são novamente devolvidos à vida livre, em ambiente natural.

Conhecimento tradicional contribui para novo método de pesquisa para captura de pacas na Amazônia

A proposta do trabalho foi a utilização de cães para a detecção das pacas na floresta, técnica tradicional de caça na Amazônia.

Durante a realização da pesquisa, foram testadas três técnicas em campo, comparando a relação de eficácia e custo das metodologias. O método apresentado no artigo pelos pesquisadores demonstrou resultados mais eficientes e baratos que técnicas científicas convencionais. Esse método foi desenvolvido a partir da adaptação e padronização científica da técnica executada por moradores locais, e realizado com aporte dos conhecimentos tradicionais de caça para subsistência na Amazônia.

Hani ressalta que dois assistentes de pesquisa tiveram participação importante para a pesquisa, que são moradores da comunidade Ubim, localizada na Reserva Amanã. O pesquisador ressalta que “apesar da caça afetar as populações de paca na Amazônia, essa atividade também pode servir como um auxiliador do desenvolvimento de estratégias de conservação para a espécie. Isso porque os moradores locais, de alguma forma, conseguem detectar e se aproximar dos animais para abatê-los”.

A proposta do trabalho foi a utilização de cães para a detecção das pacas na floresta, técnica tradicional de caça na Amazônia. “Discuti bastante essa técnica junto com os moradores locais, que me auxiliaram na padronização do método a partir do conhecimento tradicional sobre a espécie. Nós usamos dois cães de caça da comunidade, que identificavam as locas e expulsavam as pacas para a água, onde capturávamos com redes. O trabalho mostrou que a técnica de caça foi bem mais eficiente, quatro vezes mais do que as gaiolas com iscas usadas em outros locais, demonstrando o grande valor do conhecimento tradicional para aprimorar a ciência. Os moradores locais sentiram-se muito valorizados e também entraram como autores do trabalho”, reforçou Hani.

Metodologia e resultados

Foram realizadas expedições de campo entre agosto de 2013 e outubro de 2014, englobando o período de seca e cheia na região. Foi delimitada uma área de 10 hectares, onde foram aplicados os três métodos de captura: técnica de caça tradicional com cães, instalação de redes em tocas e instalação de armadilhas com iscas.

O primeiro método obteve 75% de sucesso na captura dos animais detectados, enquanto apenas uma paca foi capturada com a instalação das redes e nenhuma com as armadilhas, que ainda capturou dois animais que não eram contemplados na pesquisa e também se destacou como o método mais caro.

Conhecimento tradicional contribui para novo método de pesquisa para captura de pacas na Amazônia

No segundo método testado, foram instaladas redes sobre buracos de fuga das tocas após.

Na utilização da técnica de caça tradicional, dois cães treinados previamente por moradores locais ajudaram na detecção dos animais, expulsando-os para fora das tocas, momento em que eram capturados por rede. As buscas aconteceram durante a manhã. Para diminuir os riscos de zoonoses ou ferimentos entre os animais, os cães foram tratados e acompanhados de perto durante a atividade.

No segundo método testado, foram instaladas redes sobre buracos de fuga das tocas após. A equipe percorria as áreas demarcadas pela pesquisa para encontrar o animal, seus rastros ou sua toca. Após a instalação das redes, os animais são expulsos das tocas com o movimento de galhos e ramos. Essa técnica já era sugerida em outros estudos com a espécie.

No outro método, foram instaladas 55 armadilhas camufladas no ambiente, com iscas feitas com uma mistura de banana, mandioca e inhame. As armadilhas eram revisadas durante a noite. Esse método também é indicado para realização de pesquisas com pequenos mamíferos.

Os resultados positivos da pesquisa demonstram que a técnica bem-sucedida pode contribuir para outras pesquisas com a espécie. “Esta técnica é bastante eficiente e poderá ser aplicada em todo o bioma amazônico para obter dados antes impossíveis de se conseguir em campo, como informações reprodutivas e de saúde dos animais e a densidade populacional, e essas informações podem subsidiar estratégias de conservação adequadas para garantir uma exploração sustentável da espécie”, completou Hani.

A pesquisa contou com apoio financeiro do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), para o pagamento de bolsas. Além de Hani, também assinam o artigo Louise Maranhão e João Valsecch, do Instituto Mamirauá, e Luiz Whashington da Silva Araújo e Wigson da Silva Araújo, moradores da Reserva Amanã.

Fonte: Instituto Mamirauá

Fotos: Instituto Mamirauá

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