INCT-Adapta – Estudos sobre organismos da biota aquática em relação às mudanças ambientais


Apoiar projetos de ciência, tecnologia e inovação relevantes para o desenvolvimento do Amazonas faz parte de uma das linhas de ação da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Amazonas (Fapeam). Neste contexto, um dos projetos amparados pela Fapeam é o Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia – Centro de Estudos de Adaptações Aquáticas da Amazônia (INCT-Adapta), coordenado pelo pesquisador Adalberto Luis Val, do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa).

ADALBERTO LUIS VAL - FOTOS ÉRICO XAVIER-19

Pesquisador Adalberto Luis Val

Doutor em Biologia de Água Doce e Pesca Interior pelo Inpa, com pós-doutorado na Universidade da Columbia Britânica, Canadá, o pesquisador estuda adaptações biológicas às mudanças ambientais, tanto aquelas de origem natural como aquelas causadas pelo homem.

Em entrevista ao Departamento de Difusão do Conhecimento (Decon), Adalberto Luis Val, fala entre outros assuntos, sobre a criação e linhas de pesquisa do INCT-Adapta, possíveis interferências da epidemia do novo coronavírus nas pesquisas científicas, socialização da informação científica e o aporte da Fapeam para o desenvolvimento da pesquisa científica no Estado.

1. O senhor coordena o Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia – Centro de Estudos de Adaptações Aquáticas da Amazônia (INCT-Adapta) desde quando e o que o levou à criação deste centro de estudos?

O INCT Adapta, apoiado pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Amazonas (Fapeam) e Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), é parte do programa Institutos Nacionais de Ciência e Tecnologia (INCT), um dos mais importantes programas brasileiros para mobilização dos principais grupos de pesquisas do país. Desde a década de 1980 o nosso grupo de pesquisas tem mantido intensa colaboração com grupos de pesquisas do Brasil e de outros países e constituía naturalmente uma rede ambiciosa de pesquisa e capacitação de pessoal e, por isso, prontamente nos apresentamos para a chamada. Além da competência dos vários grupos de pesquisas que compõem o INCT-Adapta, temos acesso a um laboratório natural sem paralelos, a bacia hidrográfica amazônica. As variações ambientais, incluindo as mudanças climáticas, são o foco principal da proposta, que inclui também outros aspectos relevantes como saúde, segurança alimentar, vida na água, entre outros.

A proposta inicial bem elaborada foi muito bem classificada no processo de avaliação e selecionada para financiamento. Os resultados do projeto foram muito além do que tínhamos proposto, o que levou a um conjunto importante de resultados robustos, tanto em termos de publicações como em termos de capacitação de pessoal e internacionalização.  A produção técnico-científica, a capacitação de pessoal de alto nível e a cooperação nacional e internacional no âmbito do INCT-Adapta têm sido estimulantes, demonstrando que é possível produzir as informações que precisamos aqui mesmo na Amazônia.

2.  Quais as principais linhas de pesquisas realizadas no INCT-Adapta e quantos pesquisadores integram o centro de estudos?

São nove as linhas de pesquisas desenhadas no âmbito do INCT Adapta. Elas contribuem para avanços no entendimento de como organismos da biota aquática se adaptam às mudanças ambientais, abrangendo as mudanças naturais e aquelas causadas pelo homem, incluindo as mudanças climáticas. A diversidade de mecanismos em todos os níveis da organização biológico é o alvo dessas linhas de pesquisas. No início era um pequeno grupo de pesquisadores que se agregou em torno da ideia e, hoje, são mais de 100 pesquisadores.

3.  Quais os impactos que as pesquisas desenvolvidas no INCT-Adapta trazem para a sociedade?

A produção de informações robustas sempre representa a base para a construção de novos momentos para os avanços tecnológicos e sociais. Toda informação robusta é importante. As informações produzidas até hoje no âmbito do Adapta têm forte conexão com vários dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) para 2030, destacando-se a capacitação de pessoal e a regulamentação ambiental. Como exemplos, respectivamente, a produção de informações para a otimização dos processos produtivos de peixes em ambientes de criação, envolvendo uso de pro e prebióticos, crescimento de peixes em tempos de mudanças climáticas, capacitação de pessoal para uso de equipamentos e tecnologias de última geração e envolvimento com a concepção e discussão do código florestal. É um orgulho para o grupo o envolvimento de profissional treinada no âmbito do INCT Adapta com o esforço estadual para o diagnóstico de pessoas infectadas com a Covid-19 nestes tempos de profundos desafios sanitários e sociais.

4. Um dos projetos fomentados pela Fapeam no INCT- Adapta permitiu a construção de salas climáticas onde vêm sendo testados os efeitos dos cenários ambientais futuros, sobre os peixes da região Amazônica, até 2100. Essas informações contribuem de que forma?

Um conjunto relevante de informações já foi produzido acerca de peixes expostos aos cenários ambientais futuros, desde informações relativas à modulação da expressão de genes relacionados à adaptabilidade às temperaturas e níveis de dióxido de carbono mais altos, como previstos para o ano 2100, até informações relacionadas ao crescimento dos animais, ao efeito sinérgico de poluentes, ao custo energético dos ajustes fisiológicos e bioquímicos que podem interferir no bem-estar dos animais. Foram estudados peixes como o pirarucu, o tambaqui e espécies ornamentais. Além dos peixes, foram estudados os efeitos dos cenários climáticos futuros sobre plantas de várzea, bem como sobre os mosquitos vetores da malária. Os estudos nas câmaras climáticas estão em curso e ajudaram na concepção de alternativas para a produção de peixes (segurança alimentar) em cenários de mudanças climáticas, de estratégias para enfrentar os desafios das doenças tropicais, em particular a malária em tempos mais quentes, e a capacitação de pessoal para uso de tecnologias de última geração.

5. Vivemos um cenário de pandemia! Isso tem provocado transformações no modo como os cientistas trabalham? Quais são as possíveis interferências da epidemia do novo coronavírus nas pesquisas científicas do INCT- Adapta ou de que forma os pesquisadores vêm se adaptando à nova realidade?

Sofremos uma interrupção relevante. Forçosamente vários projetos e alguns experimentos de longo prazo foram interrompidos. Por outro lado, estamos aprendendo a trabalhar em períodos com novos desafios, longe do conforto de nossos laboratórios, onde as ideias podem ser testadas, podem ganhar vida, podem ser contrastadas com outras ideias. Há, definitivamente, um mudo imenso fora dos laboratórios do qual precisamos nos apropriar. Contudo, uma situação como essa causada pelo novo coronavírus nos impõe reflexões diversas e, para nós do INCT Adapta, permitiu reflexões acerca da importância dos estudos desenvolvidos, particularmente no que se refere ao que está escondido na biodiversidade Amazônica, aos microrganismos, vírus e bactérias, por exemplo, que podem “pular” para o homem, causando novos problemas. Quanto mais “desafiamos” a floresta, impondo aos organismos desafios adaptativos, estamos também impondo aos seus hospedeiros a busca de novos hospedeiros. Muitas zoonoses podem surgir por conta dessas ações antrópicas, incluindo as mudanças climáticas. As tecnologias de última geração permitem nos antecipar a esses desafios e para isso precisamos de pessoal qualificado. O trabalho remoto, por conta do cenário pandêmico, possibilitou mergulhar em uma literatura mais ampla, permitiu reflexões, permitiu desenhar novos experimentos e buscar meios mais efetivos para colocar a ciência no colo da sociedade. Permitiu que a sociedade percebesse a importância da Ciência.

6. Na sua visão como avalia o papel da Fapeam no fomento da ciência, tecnologia e inovação no Amazonas?

Sem exageros, o futuro é conhecimento dependente da ciência que é um processo dinâmico. A Fapeam, portanto, viabiliza o futuro, o nosso futuro. Isso requer trazer as demandas sociais para as “bancadas dos laboratórios”, requer apoiar a socialização das respostas a essas demandas sociais, requer a sensibilidade para a dinâmica própria da ciência e a sua interlocução com o front mundial da ciência. A Fapeam nasceu com esses e muitos outros desafios, a sua criação mostrou-se fundamental para nosso estado impor-se entre os que fazem ciência de alto nível, servindo de referencial e estímulo para o advento de outras FAPs aqui na Amazônia. Portanto, a Fapeam é o caminho seguro para o amanhã.

7. Em uma entrevista o senhor disse que a ciência é uma atividade social que busca melhorar os processos de inclusão social através do conhecimento. De que forma socializar a informação científica?

Sem dúvida, a ciência é uma atividade social com fins sociais. É uma atividade que ganha a partir de interações entre os pares, mas também com a sociedade. É sempre uma atividade de mão dupla, com o objetivo de trazer as questões que emergem dessa interação social para as bancadas dos laboratórios. A socialização da informação não é uma tarefa trivial, pois depende de informações robustas e da apropriação da informação pela sociedade que requer condições específicas. Quanto mais intensa é a apropriação da informação pela sociedade, mais intensos e efetivos são os processos de inclusão social. Assim, apoiar a ciência e sua socialização é de fundamental importância para uma sociedade mais justa e equânime.

Por: Helen de Melo

Fotos: Érico Xavier