Infra-estrutura precária compromete benefícios do gasoduto, diz pesquisa
As promessas de melhoria da qualidade de vida para grande parte das comunidades do município de Manacapuru, com a implantação do gasoduto Coari-Manaus, constantes do Estudo Prévio de Impacto Ambiental e do Relatório de Impacto Ambiental (Epia-Riama), devem ficar só no papel. Essa foi uma das conclusões a que chegou o pesquisador Isaque dos Santos Sousa, num estudo sobre os potenciais impactos do gasoduto no município de Manacapuru, transformado em dissertação de mestrado. O trabalho, desenvolvido no Programa de Pós-Graduação em Arquitetura e Urbanismo da Universidade Federal de Santa Catarina, foi defendido em maio deste ano.
Sousa destaca que a obra ainda está em andamento, mas afirma que as evidências são de que os serviços públicos como energia elétrica, telefonia e saneamento básico devem continuar como eram antes do gasoduto. “Mesmo acreditando que o gasoduto é diferente dos outros projetos implantados na Amazônia, não acredito que as promessas serão cumpridas. Vai ter comunidade que vai continuar usando a lamparina”, disse, em entrevista sobre o trabalho. Sousa realizou mestrado com bolsa da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Amazonas (Fapeam).
De acordo com a pesquisa, existem 50 comunidades instaladas na área de influência do gasoduto Coari-Manaus. Sousa visitou 28 e estudou cuidadosamente 14. “No primeiro ano do trabalho eu visitei 28 comunidades e, no segundo ano, voltei em 14 delas para ver se houve mudança”, disse, para em seguida informar que não houve mudanças significativas.
Nas considerações finais da dissertação, ao comentar as condições sócio-ambientais das comunidades, o pesquisador escreveu: “Verificou-se que essas localidades encontram-se em precárias condições no tocante aos serviços públicos que deveriam ser disponibilizados para o atendimento dos moradores ali presentes. Neste sentido, muitas das mudanças previstas como impactos negativos são, na realidade, ausentes ou funcional em péssimas condições”.
O pesquisador cita como exemplos dessas péssimas condições os serviços do sistema de saúde, as escolas nas comunidades rurais, a falta de coleta de lixo e a falta de segurança, pela ausência de delegacias.
Para efeito de análise, Sousa dividiu a implementação do gasoduto Coari-Manaus em três fases: a de implantação (preparação do terreno, abertura de trilhas), a de construção e a de operação. Durante as visitas às comunidades, estava sendo executada a segunda fase.
Uma das principais promessas do Epia-Rima, elaborado pela Universidade Federal do Amazonas, para a segunda fase, era a melhoria da rede de comércio, devido ao grande número de trabalhadores que seriam destacados para a obra. A rede de energia elétrica e a instalação de sinal de telefonia fixa também foram incluídas no Epia-Rima. “Para muitos moradores, tais transformações permanecem apenas na expectativa”, escreveu Sousa.
Outra promessa era de que o projeto aproveitaria a mão-de-obra local para o serviço de construção. Não foi o que se constatou. “Na primeira fase ainda foram escolhidos trabalhadores das comunidades, mas na segunda, ninguém estava trabalhando. Havia informação nas comunidades de que até mateiros foram levados de Manaus”, afirmou.
Questionado sobre a possibilidade de esses benefícios chegarem depois da fase de construção, o pesquisador deu a seguinte resposta: “As experiências internacionais de gasodutos e oleodutos, principalmente nos países africanos, demonstram que as comunidades sempre ficaram abandonadas”.
Aspectos positivos
Apesar da crítica, Isaque Souza afirma que é um defensor do gasoduto. “Não acho que a construção é um absurdo, como alguns colegas meus a consideram”. Ele destacou no trabalho aspectos positivos, como a construção de centros comunitários, escolas e postos de saúde em parte das 50 comunidades no município de Manacapuru, mas considera tais benefícios insuficientes para assegurar o desenvolvimento.
“Se considerarmos desenvolvimento a entrega de barcos-ambulâncias e a construção de centros comunitários, podemos dizer que houve desenvolvimento; mas penso que o desenvolvimento só acontecerá se as comunidades forem capazes de se auto-sustentar depois da obra”.
Sousa avalia como positivo o Programa de Infra-Estrutura Sócio-Comunitária (PISC), desenvolvido pela Petrobras nas comunidades rurais e indígenas. Esse programa incentivou a criação de associações de moradores e deu suporte para a legalização dessas entidades. “Em muitas dessas comunidades não havia sequer uma associação de moradores formalizada”. Além da construção de centros comunitários e escolas, a maioria das comunidades rurais ganhou poço artesiano.
A formação de lideranças comunitárias foi outro ponto positivo destacado na pesquisa, também fruto do PISC. Esse trabalho foi realizado durante a primeira fase de implementação do gasoduto, logo depois do licenciamento ambiental. No entanto, Sousa aponta a necessidade de as lideranças e as associações se manterem organizadas para cobrar a melhoria de qualidade de vida para suas comunidades.
Por fim, o pesquisador aponta medidas que precisariam ser implementadas para garantir o mínimo de desenvolvimento prometido pela obra do gasoduto nas comunidades da área de influência, entre as quais, planejamento de novos empreendimentos que possibilitem a geração de emprego na área de turismo; planos de manejo florestal; estudos de viabilidade econômica e potencial agrícola das comunidades; levantamento dos frutos que podem ser explorados comercialmente (extrativismo); formação política de novas lideranças comunitárias.
Valmir Lima – Decon/Fapeam