Insetos e impressora 3D são opções para alimentação no futuro

Bifes como conhecemos hoje vão ser raros e caros (Foto: Divulgação)
02/07/13 – Você chega em casa cansado, tira do congelador um pacote de almôndegas desenvolvidas em laboratório. Digita na impressora 3D o cardápio que vai acompanhar: uma pizza feita de ingredientes em pó. E separa na geladeira dois tomates roxos para fazer uma salada, salpicada com um produto que tem gosto de ovo, mas na verdade é feito de gergelim. Bom apetite, este vai ser o jantar dos anos 2050.
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No século passado, os futuristas imaginavam que a comida da virada do século seria composta por uma série de pílulas — ninguém perderia tempo preparando uma salada quando todos os nutrientes necessários estivessem ao alcance da mão. “Em cem anos, as pessoas vão se alimentar exclusivamente com pílulas sintéticas”, disse a escritora e ativista Mary Elizabeth Lease, em 1893. Nada mais improvável. “Nunca vamos abrir mão do prazer de preparar uma refeição, mesmo que seja usando uma impressora e não um fogão. A combinação de aromas e cores de um prato e o convívio ao redor da mesa com a família e os amigos são tão importantes hoje quanto há 3.000 anos”, afirma o agrônomo canadense Christophe Pelletier, autor de Future Harvests, livro que tenta prever como a humanidade vai se alimentar daqui a 37 anos.
Nove bilhões de bocas para alimentar
Algumas tradições vão mudar por um motivo simples: em quatro décadas, a humanidade vai ter ultrapassado os 9 bilhões de habitantes, 2 bilhões a mais do que atualmente. Em 40 anos, o planeta vai ter recebido mais uma quantidade de humanos equivalente à soma de uma China e dois Estados Unidos hoje. Vai ser preciso gerar comida o suficiente para cada um dos principais grupos alimentares — vitaminas, sais minerais, fibras, proteínas, carboidratos e gordura. Arroz, por exemplo, não será um problema: com dinheiro da Fundação Bill Gates e suporte da Academia Chinesa de Ciências da Agricultura, o agrônomo chinês Zhikang Li criou uma variedade que cresce rápido, produz mais grãos e é extremamente resistente a inundações, secas, pestes e insetos. São as proteínas de origem animal que representam o maior desafio.
A Organização
o das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação prevê que, em quatro décadas, o aumento da quantidade de terras usadas para a pecuária teria de ser da ordem de 70%, de 34 para 57,8 milhões de quilômetros quadrados, ou quase três Brasis. Impossível. “Não vamos conseguir produzir carne em quantidade suficiente para toda a população. Os bifes como conhecemos hoje vão ser raros e caros”, diz a britânica Morgaine Gaye, especialista em tendências do mercado de alimentos e professora na Nottingham Trent University.
Alternativas
Algumas alternativas já existem, e são mais sofisticadas do que os produtos à base de soja. Depois de 10 anos de desenvolvimento em parceria com a Universidade do Missouri, uma startup americana desenvolveu um composto de ervilhas que, depois de processado, fica muito parecido com um pedaço de carne. Com a vantagem de não ter colesterol, gordura saturada ou os hormônios ministrados aos animais. O resultado é tão parecido com carne
de frango que já enganou consumidores submetidos a testes cegos. Os ovos também já podem ser substituídos por um pó esverdeado que tem o gosto do ovo comum e pode ser usado em bolos, saladas e doces. Mas é feito a partir de uma base de gergelim, produção de outra fábrica americana. Estes produtos, entretanto, não vão dar conta da demanda em larga escala.
Uma das soluções mais viáveis para o problema da demanda global por proteínas nas próximas décadas está nos insetos.
Pão de grilo
Para a Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura, os insetos, esses “apetitosos” bichinhos crocantes de seis patas, são o futuro. Os motivos alegados são bons. Insetos são ricos em proteínas: proporcionalmente, moscas têm quase o dobro do que bois. Por outro lado, têm pouca gordura e boas doses de cálcio e ferro.
Também são animais fáceis de criar: eles ocupam pouco espaço, consomem menos água e se reproduzem com facilidade. Com 2 quilos de ração, é possível produzir 1 quilo de comida, enquanto que 1 quilo de carne de gado precisa de 8 quilos de alimentos. Variedade não falta: de acordo com a FAO, existem cerca de 900 espécies diferentes comestíveis. Em muitos países, eles já fazem parte da dieta há séculos: os japoneses comem vespas, os tailandeses gostam de grilos, os africanos cozinham larvas e os chineses vendem espetinhos de gafanhotos nas ruas. O governo da Holanda quer que o país entre nesta lista: está investindo 1 milhão de euros em pesquisas para dar início à criação de fazendas de insetos.
Por saberem que o consumidor ocidental dificilmente vai querer mastigar gafanhotos, os holandeses estudam usar insetos como base para produzir carne processada, como hambúrgueres e almôndegas. E também adotá-los como base para enriquecer alimentos do dia a dia, como pães, massas e bolos produzidos com farinha feita de grilos.
Uma coisa é certa: pouca gente vai ter dinheiro para comer diariamente grandes nacos de carne, como aqueles das nossas churrascarias. A carne processada vai dominar os pratos das pessoas. Estes hambúrgueres, almôndegas, nuggets, salsichas e linguiças poderão vir de boas imitações de carne. Ou de insetos. Ou da carne desenvolvida in vitro: uma cultura de células-tronco vai ser capaz de se reproduzir até formar um alimento igual aos que conhecemos hoje.
A ciência também está sendo aplicada em outras frentes. A engenharia genética e a nanotecnologia prometem mudar a cor, o tamanho e os nutrientes de alimentos que conhecemos bem. E as impressoras 3D vão dar um sentido totalmente novo ao ato de cozinhar.
Impressora na cozinha
Vários alimentos que prometem compor o prato do futuro estão em desenvolvimento. Uma equipe de pesquisadores americanos e israelenses já produziu tomates com aroma de limão. Israel, aliás, é um polo de desenvolvimento: os fazendeiros de lá já criaram pimentões com três vezes mais vitaminas, cenouras que se parecem batatas e bananas geneticamente modificadas para ficarem azuis – elas têm mais potássio, e a cor inusitada não tem objetivo algum, a não ser atrair os clientes mais curiosos e corajosos. Na Inglaterra, pesquisadores do Centro John Innes desenvolveram tomates roxos, geneticamente modificados para ter o dobro de antioxidantes e ajudar na prevenção de câncer.
Em outra frente, nanopartículas aplicadas em sementes podem acusar se o alimento está contaminado por bactérias e matá-las. Quando em contato com a língua, também serão capazes de bloquear ou reforçar sabores. “Podemos imaginar maracujás muito mais doces, sem a sensação de azedo. Ou exatamente o contrário, dependendo da vontade do cliente”, afirma Christophe Pelletier. Na forma de embalagens, também podem preservar os nutrientes por mais tempo e, com isso, reduzir a necessidade de agrotóxicos durante o plantio.
O preparo dos alimentos também vai mudar. E ficar mais parecido com a cozinha dos Jetsons, desenho criado na década de 60 que retratava uma família futurista e no qual a comida era produzida por computadores – a mãe só precisava perfurar cartões (algo não muito futurístico) para fazer a encomenda para a máquina. A Nasa está investindo no projeto do engenheiro mecânico Anjan Contractor, que está desenvolvendo formas de transformar carboidratos, proteínas e nutrientes em pós, que poderão ser misturados de acordo com o gosto do cliente. Seria prático para os astronautas, que poderiam comer pizza no espaço, e também para as residências: pessoas de idade ou com dificuldade de locomoção, por exemplo, poderiam cozinhar sem esforço.
Fonte: Revista Veja