O desafio de realizar pesquisas na Amazônia

Doutor em Biologia Parasitária, o biólogo Sérgio Luiz Bessa Luz, 50 anos, tem uma longa relação com a Amazônia. Foto: Isaac Guerreiro/Agência FAPEAM.
Doutor em Biologia Parasitária, o biólogo Sérgio Luiz Bessa Luz, 50 anos, tem uma longa relação com a Amazônia. Em 1987, iniciou suas atividades percorrendo vários Estados da região Norte. No Amazonas, trabalhou em projetos sobre a malária na hidrelétrica de Balbina. No Pará, junto à hidrelétrica de Tucuruí e, em Rondônia, em assentamentos rurais. Em 1998 foi aprovado no concurso para pesquisador do Instituto Leônidas e Maria Deane (ILMD), instituição representativa da Fundação Oswaldo Cruz na Amazônia, atividade que exerceu até 2013, quando se tornou diretor da unidade.
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Durante os 27 anos de relação com a região amazônica, Luz também atuou como pesquisador visitante no Natural History Museum, na Inglaterra, e na Wageningen Agricultural University, Holanda. O diretor recebeu a equipe da Amazonas Faz Ciência e comentou as ações que o ILMD/Fiocruz Amazônia vêm realizando. Confira a entrevista.
Amazonas Faz Ciência (AFC): Em 2013, o senhor assumiu a direção do ILMD/Fiocruz Amazônia, cuja missão é contribuir para a melhoria das condições de vida e saúde das populações amazônicas, além de colaborar para o desenvolvimento científico e tecnológico regional. Essa função é o seu maior desafio como profissional?
SL– Não diria maior, mas, sem dúvida, é um novo desafio. Eu sou pesquisador e sempre atuei como tal. De certa forma, atuamos com gestão o tempo todo. Seja dentro de laboratórios, em grupo de pesquisa ou no próprio projeto. Atualmente, estou na gestão da unidade técnico-científica da Fundação Oswaldo Cruz na Amazônia, ou seja, num conjunto maior, e tenho que visualizar, de modo geral, todos os grupos de pesquisa. Por isso, considero um novo desafio, um desafio muito valioso e necessário neste momento, pois estou aqui nesta unidade desde que ela se estabeleceu, física e funcionalmente. É claro que a unidade Fiocruz Amazônia tem mais de 20 anos e meu período é menor na casa, todavia, acompanho as pessoas que entraram via concurso, as linhas de pesquisa que vêm sendo trabalhadas, o trabalho terceirizado e os estagiários. Tenho noção de como foi o crescimento nesse período em que estou no instituto.

Luz disse que há um projeto grande de nacionalização da Fiocruz. Foto: Isaac Guerreiro/Agência FAPEAM.
AFC – A Fiocruz tem unidades no Amazonas e Rio de Janeiro. Mas qual a abrangência da Fiocruz?
SL – A Fiocruz, na realidade, tem várias unidades. Há um projeto grande de nacionalização. Temos centros de pesquisa no Paraná, Minas Gerais, Salvador, Recife e vivenciamos um processo maior de expansão, com as novas unidades no Ceará, Mato Grosso e em Rondônia. Na região amazônica, nós convencionamos denominar Fiocruz Amazônia porque tratamos de problemas da saúde da Amazônia. Entretanto, tratando-se de saúde, não podemos estabelecer fronteiras. Trabalhamos, de forma geral, no Amazonas, porém, há unidades em outros Estados da Amazônia.
AFC – O ILMD tem o desafio de melhorar as condições de vida e saúde do povo amazônida. Como são realizadas as ações na Amazônia?
SL – Convido a imaginar nossa região como um mosaico entre população e biodiversidade. Logo, mas ações nem sempre são fáceis. O padrão geral da saúde no Amazonas, no que tange ao índice de doenças crônicas degenerativas como o câncer, doenças cardiovasculares, diabetes etc. é semelhante ao resto do País. Porém, temos índices que não são iguais quando nos referimos às questões sanitárias no Estado, ou seja, em relação às doenças infecto-parasitárias. As regiões Norte e Nordeste apresentam índices bem alarmantes, que chegam ao patamar, ou muito semelhante, das doenças crônicas degenerativas. As ações da Fiocruz são direcionadas para que seus projetos gerem políticas públicas de saúde que possam ser aproveitadas na região amazônica.

Há mais de 20 anos a Fiocruz Amazônia estuda os ambientes amazônicos e as relações com as doenças endêmicas da região. Foto: Divulgação.
O mundo atual requer que as pesquisas tenham aplicabilidade imediata, ou melhor, que entre na ‘prateleira para ser consumida diretamente’. Esse é o retrato do mundo atual. Logo, além de buscar colaborar na formulação de políticas públicas, buscamos formar recursos humanos específicos para a área de saúde. Capacitamos os principais polos do Estado do Amazonas. Temos o curso de especialização em jornalismo científico, que é uma tentativa de melhorar a informação científica em saúde para o público. Temos estudos de populações vulneráveis, como a ribeirinha, a indígena e as que vivem em assentamentos rurais. Na área indígena, por exemplo, capacitamos recursos humanos por meio da formação de agentes indígenas comunitários em saúde, para que eles próprios assumam as funções de agente de saúde em suas comunidades.
AFC – O ILMD desenvolve projetos na área da saúde, com estudos sobre a malária, leishmaniose e outras endemias que têm relação direta ou indireta com o meio ambiente. Há projetos que buscam entender essas interações?
SL – Interessante essa pergunta. Temos estudos que denominamos de ‘Ecologia de Doenças Transmissíveis na Amazônia’. Desenvolvemos o programa numa área permanente de trabalho, na qual procuramos entender as modificações ambientais de um assentamento rural ao longo dos anos. Como essas modificações feitas pelos homens interferem ou modulam o processo ou padrão epidemiológico das áreas? Nós acreditamos ser um tema importante a ser pesquisado, porém, são estudos que demandam tempo para serem consolidados, mas que são muito importantes para a Amazônia e para o mundo inteiro. Particularmente, acredito que seja o último lugar onde se possa estudar dentro do campo, como as modificações ambientais vão fazer transições dos padrões epidemiológicos que acontecem.
O aumento da população e do desmatamento, o uso da terra, como esses fatores podem interferir nos perfis de doenças como malária, leishmaniose, doenças diarréicas, no sentido de agravá-las ou não. Nosso objetivo é produzir uma base de dados que no futuro possa ser usada como modelo ou piloto em outras áreas da Amazônia, pois a região tem esse aspecto do assentamento rural, de comunidades se formando. Como os processos de doença acontecem nessas áreas? Temos estudos de biodiversidade de fungos da floresta, de diferentes espaços ambientais, potenciais biotecnológicos de fungos, que podem ser utilizados na ação de antimicrobianos e de insumos pra saúde humana.
Leia a entrevista completa na revista Amazonas faz Ciência, n° 32
Carlos Fábio Guimarães – Agência FAPEAM