Pesquisa analisa qualidade da água em terra indígena
07/01/2011 – A ponte entre o conhecimento científico e os saberes do povo indígena Mayoruna levou os alunos do 6o ao 9o ano da Escola Indígena Nossa Senhora de Nazaré na comunidade de Marajaí, à margem direita do Rio Solimões, aos estudos para a melhoria da qualidade da água consumida pela comunidade.
Localizada no município de Alvarães, a 45 minutos de Tefé (a 516 quilômetros de Manaus em linha reta), a comunidade recebeu os benefícios do projeto “Análise da Qualidade da Água na Terra Indígena Marajaí”, sob coordenação da pesquisadora Sandra Zanotto, do Programa de Pós-graduação em Biotecnologia e Recursos Naturais da Amazônia – MBT , da Universidade do Estado do Amazonas (UEA).
Com recursos do programa Jovem Cientista Amazônida (JCA), financiado pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Amazonas (FAPEAM), a ideia do projeto foi incentivar os estudantes, oferecendo a eles noções básicas sobre a importância da manutenção dos recursos hídricos da região, capacitando-os para o monitoramento, durante 12 meses, da qualidade microbiológica da água consumida por esta população.
De acordo com a coordenadora do projeto, aulas expositivas, leituras, jogos e recursos audiovisuais foram utilizados e contextualizados segundo a realidade do local.
O fato de a comunidade ter 56% da população de 487 habitantes na faixa etária até 15 anos de idade indica o impacto da educação ambiental nos alunos envolvidos, além de suas famílias. “A Escola Nossa Senhora de Nazaré apresenta dois aspectos diferenciais em relação às escolas da região exatamente pela quantidade maior de alunos, além da infraestrutura superior. Por esta razão a escola submeteu as propostas ao Programa”, enfatizou.
Apoio de outras instituições foi fundamental
O apoio da extinta Fundação Estadual dos Povos Indígenas (FEPI), de acordo com Zanotto, também foi fundamental para a execução da pesquisa, que durou 18 meses.
Em três viagens até o local, os pesquisadores trabalharam em explanações sobre a problemática do tema proposto por meio de conceitos teóricos, discussão de artigos e vídeos, além da implementação na escola de um laboratório para análises microbiológicas. Iniciava-se então o aprendizado das metodologias empregadas nos experimentos.
Com os dados preliminares, a segunda visita foi de análise do material coletado e aplicação de questionário sobre a rotina dos locais de consumo de água da comunidade. No último encontro fez-se o encerramento do projeto com a apresentação dos resultados obtidos.
A preocupação com a qualidade da água, disse Zanotto, despertou nos alunos o interesse pela coleta de lixo na região. “Logo após a primeira visita dos pesquisadores, onde se verificou o apoio de todos os membros da comunidade, vimos o interesse nas práticas para a melhoria da qualidade de vida da população”, destacou.
Um dos principais resultados do projeto foi a determinação das áreas que estão próprias para consumo e a participação dos agentes de saúde comunitários. “Foram informadas as áreas impróprias e esclarecidas as formas corretas de armazenamento da água para evitar contaminação. Uma lista de equipamentos foi deixada no laboratório da escola para a continuidade dos estudos dos alunos”, disse Sandra Zanotto.
Saneamento
Com a retirada de água de várias fontes, como o rio Solimões, dois leitos de igarapés que percorrem paralelamente por trás e pela frente da comunidade, poço artesiano e pequenos igarapés dentro do centro da mata e próximos às roças, verificou-se que não há qualquer controle dessa água, inclusive da que é utilizada durante o plantio e a colheita.
A cloração do poço comunitário é o único indicativo de qualidade. Em decorrência dessa realidade, a incidência de doenças como diarreia, verminoses e hepatite, conforme relatos de agentes de saúde, é grande na região. “A água do poço é distribuída de forma controlada, porque os recursos da comunidade para a compra do diesel do motor que faz a distribuição são escassos, fazendo com que a população utilize a água com restrições”, explicou a pesquisadora.
Com o projeto, foram abordados aspectos sensoriais, físico-químicos e microbiológicos da água, além de informações de como melhorar a qualidade para o consumo.
Para a coordenadora, ficou evidente a plena capacitação dos alunos e professores envolvidos no projeto. A compreensão sobre a metodologia de detecção de coliformes em amostras de água, da importância de se consumir água limpa ou tratada, transformou os hábitos locais, especialmente porque os estudantes são multiplicadores do conhecimento e da constatação de que, segundo dados fornecidos por Zanotto, somente 1% da água do planeta hoje está disponível para consumo humano.
Uma das causas das contaminações apontada pela coordenadora é o período de cheia dos rios, já que todos os igarapés da comunidade se interligam nesta época, uns infectando os outros. “Outra explicação pode ser a existência de um grande número de animais de criação, bovinos e caprinos, que percorrem livremente pela comunidade, inclusive ingerindo água de reservatórios que se encontram abertos e dos igarapés analisados neste projeto”, ressaltou.
Outro fruto das pesquisas foi a filmagem de mais de 20 horas de material bruto, reunindo aulas, palestras, reuniões e registros diversos relacionados ao tema “água na Terra Indígena Marajaí”. O material será base para um acervo de documentação visual, para demais consultas e análises, sendo disponibilizado no Núcleo de Imagem, Direito e Meio Ambiente, vinculado ao Programa de Pós-Graduação em Direito Ambiental, da Universidade do Estado do Amazonas (UEA).
Alessandra Leite-Agência FAPEAM