Pesquisa cria Atlas Linguístico do Baixo Amazonas


Quem nunca ouviu algum interiorano do Estado do Amazonas falar "Lete" ao invés de Leite; "madera" ao invés de madeira ou "pecoço" ao invés de pescoço? Identificar os falares da microrregião do Baixo Amazonas, ou seja, registrar como falam os nativos de municípios Nhamundá, Urucará ou Boa Vista do Ramos foi o objetivo da pesquisa de Roseanny Melo de Brito, mestranda do Programa de Sociedade e Cultura no Amazonas da Universidade Federal do Amazonas (Ufam).

 

A pesquisa foi realizada por meio de um estudo dialectológico, ou seja, a descrição comparativa dos diferentes dialetos de cada região estudada, com análise fonético-fonológica, que consiste em analisar os sons de uma língua, no caso o português.

De acordo com Brito, os estudos linguísticos voltados para a caracterização do português do Brasil são pouco expressivos. A pesquisa pode ser conferida no Atlas Linguísticos dos Falares do Baixo Amazonas (AFBAM), que será defendido como dissertação de mestrado, no fim de abril, no auditório Rio Negro, às 9h, na Ufam.

Ex-bolsista da FAPEAM no Programa RH-Posgrad, a pesquisadora concede entrevista à Agência Fapeam sobre a importância deste trabalho e os resultados preliminares.

 

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Agência Fapeam – Qual foi o objetivo da pesquisa realizada no baixo Amazonas e em quanto tempo ela foi realizada?

Roseanny Melo de Brito A pesquisa foi realizada em pouco mais de três anos com o objetivo de melhor se estudar, analisar e caracterizar os falares típicos da microrregião do Baixo Amazonas. 

Agência Fapeam – O Atlas contou com quantas localidades estudadas ?

RB – Foram cinco municípios que compõem a micro-região do Baixo Amazonas: Nhamundá, Urucará, São Sebastião do Uatumã, Boa Vista do Ramos e Barreirinha. Parintins, o sexto município dessa região, não foi investigado, pois já existia estudos sobre o assunto no Atlas Linguístico do Amazonas (ALAM), elaborado pela Doutora em Letras formada pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ)  Maria Luiza de Carvalho Cruz Cardoso.

Agência Fapeam – Qual o critério utilizado para a escolha dos municípios?

RB – Nhamundá, pelo valor histórico da região. Foi nesse local que Francisco Orellana, supostamente, deparou-se com as lendárias Amazonas, nome que deu origem ao rio e, mais tarde, ao Estado do Amazonas. Além destes critérios, considerou-se ainda o fato de ser esta uma região sem registro dialético.

Agência Fapeam – Qual a metodologia utilizada durante a pesquisa para chegar aos resultados obtidos?

RB – Durante a pesquisa obtive informações históricas, econômicas, geográficas e culturais sobre os municípios estudados e pressupostos referentes à fonética, fonologia e dialetos. A obtenção dos dados linguísticos se deu através da aplicação de um questionário fonético-fonológica. O questionário foi o mesmo utilizado para a elaboração do ALAM, por suas questões já terem sido testadas com aprovação para esse tipo de pesquisa in loco. Tais dados foram gravados com gravador e posteriormente transcritos, de acordo com as normas do Alfabeto Fonético Internacional (IPA).

 

Agência Fapeam – O que são Cartas Fonéticas?

RB – As cartas fonéticas ou cartas linguísticas são informações coletadas com os entrevistados a fim de organizar um mapa com dados da pesquisa. Foram realizadas 197 perguntas para cada participante. E nelas podemos constatar que alguns falam com nasalização e outros não. Alguns falam bánãna e outros bãnãna. A palavra pescoço, elegante e fogão também sofrem variação conforme a região estudada. Eles usam os timbres abertos e fechados. 

 

Agência Fapeam – Quais os principais resultados obtidos?

RB – O resultado obtido foi a própria elaboração do atlas, no qual é possível visualizar o modo de falar característico da micro-região estudada. Dentre as diversas manifestações linguísticas detectadas, observou-se que os falantes do Baixo Amazonas, como na maior parte do Brasil, tendem a monotongar, eliminar a vogal “i” dos ditongos, como: leite sem o “i” (lete); quanto ao “s”, em final de sílaba e em final de vocábulo, só se realizou como variante pós alveolar, ou seja, condição de falar, na letra “s”, por exemplo, eles falam mas ao invés de mais (intensidade).  Eles chiam com intensidade “s” das palavras.

 

Agência Fapeam – Quais os critérios das escolhas dos participantes de acordo com a faixa etária e grau de instrução?

RB – A escolha dos informantes obedeceu aos seguintes critérios geolinguísticos: ser analfabeto ou ter cursado, no máximo, até a 4ª série do Ensino fundamental; ser natural da localidade selecionada e ter, preferencialmente, pais e cônjuge da região linguística em estudo; não ter-se afastado da localidade por mais de 1/3 de sua vida; apresentar boas condições de fonação.

Em cada ponto de inquérito, contou-se com seis informantes num total de 30. Sendo um homem e uma mulher em três faixas etárias: 18 a 35 anos (faixa 1), 36 a 55 anos (faixa 2) e 56 anos em diante (faixa 3).

 
Agência Fapeam – Foram encontradas diferenças linguísticas?

RB – Sim, mas é importante ressaltar que as diferenças linguísticas encontradas serviram para caracterizar o falar do Baixo Amazonas, não para distinguir o modo de falar entre um e outro município.

 

Vanessa Leocádio – Agência Fapeam

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