Pesquisa utilizará abelhas na polinização do camu-camu
Ela é uma fruta rica em vitamina C (ácido ascórbico). O alto teor de ácido ascórbico (2950 mg por 100g de fruto) é superior ao encontrado em frutas como a acerola, limão, laranja, entre outras. Isso significa ser 60 vezes superior à quantidade produzida pelo limão e cerca de 100 vezes mais do que a laranja. Mas ela passa despercebida entre a maioria da população da região, apesar de ser encontrada em quase toda a Amazônia nas margens dos rios e lagos. Todavia, devido ao seu potencial econômico vem despertando a atenção dos cientistas do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (INPA).
Estamos falando do camu-camu, também conhecido como caçari ou araçá-dágua (Myrciaria dubia). A grande importância do fruto como alimento é devido ao seu elevado teor de vitamina C. Contudo, quando pensa-se em plantá-la em larga escala, ainda existem gargalos à serem superados para uma efetiva produção em escala comercial. Uma alternativa encontrada por pesquisadores do INPA foi a utilização de abelhas sem ferrão na polinização do camu-camu em áreas de plantio em terra-firme.
Segundo o pesquisador responsável pelo trabalho, Alexandre Coletto da Silva, a idéia do projeto "Uso de abelhas sem ferrão na polinização e estudo da entomofauna associada ao camu-camu (Myrciaria dubia) na Amazônia Central", é manejar abelhas provenientes de um meliponário (local onde se cria abelhas sem ferrão) migratório em áreas de plantio do camu-camu para aumentar a produtividade dos frutos. Isso porque observações anteriores indicaram que essas abelhas são capazes de visitar as flores do camu-camu em determinadas áreas de cultivo e também em ambientes naturais. Vale ressaltar que as abelhas Melipona são responsáveis por 30% a 90% da polinização das árvores, dependendo do bioma considerado.
“O camu-camu é uma planta extremamente promissora por ser nativa e dela se aproveitar os frutos para preparação de sucos, geléias, bebidas alcoólicas, sorvetes, cosméticos, entre outros, e por ter um alto valor nutricional, principalmente, para a população local. Todavia, o plantio em escala agronômica está suscetível ao ataque de pragas, por isso, durante a pesquisa, será feito também o levantamento dos insetos que possam causar prejuízos econômicos para os produtores”, explicou Coletto.
As plantas que serão estudadas, durante a pesquisa, possuem características agronômicas importantes, por exemplo, frutos com maior quantidade de polpa do que os encontrados em área de várzea. Essas plantas fazem parte de um banco de germoplasma de diferentes acessos (populações de vários locais da Amazônia, como, os rios Cauamé em Roraima, Candeias em Rondônia, Uatumã no Amazonas e também do Peru). “Como não podemos trabalhar com 200 e/ou 300 plantas, faremos uma amostragem dessas diferentes populações”, informou.
Os trabalhos em campo serão realizados na Estação Experimental de Hortaliças do INPA, localizada no Km 14 da Avenida Torquato Tapajós e também na Fazenda Yurican, localizada na AM-010, Km 100. Além dessas áreas experimentais, também serão coletados dados em plantios naturais, na várzea. Nas áreas experimentais, serão realizados testes de polinização, ou seja, será verificado a taxa de polinização com e sem a introdução de colméias. Para isso, diferentes flores serão marcadas e, paralelamente, serão coletados dados comportamentais das abelhas, com análise de fotografias e vídeos, observações comportamentais diretas, etc.
“As colméias serão deslocadas do meliponário, próximo a Manaus, às áreas de plantio em estudo, pois não poderemos deixá-las, permanentemente, nos locais da pesquisa por se tratarem de áreas distantes. Para a manutenção das colméias é necessário um conjunto de procedimentos que chamamos de manejo (alimentação artificial, cuidado com inimigos naturais, limpeza, etc). Por isso, somente quando necessário essas colméias serão deslocadas para as áreas experimentais de manejo do camu-camu”, ressaltou.
O pesquisador disse que as coletas serão realizadas durante 24 meses, período de duração do projeto. No primeiro ano, serão feitas análises dos testes de polinização, ou seja, se as abelhas estão visitando as flores do camu-camu. O mesmo processo será repetido no ano seguinte. Para isso, serão utilizadas redes entomológicas (ver boxe) para captura das abelhas, aspiradores e frascos diversos. Ele ressaltou que será dado atenção especial aos meses de floração maciça do fruto que vai de novembro a março.
O pesquisador afirmou que durante seu doutorado, finalizado no início do ano passado, se dedicou a implantar e desenvolver projetos de meliponicultura (manejo de abelhas sem ferrão) em áreas indígenas. Além disso, coletou valiosas informações sobre o etnoconhecimento (saber dos povos tradicionais: índios, caboclos, ribeirinhos, etc), a biologia e o manejo desses insetos e agora pretende trabalhar também outros serviços que as abelhas podem prestar ao meio ambiente, como a polinização de plantas de interesse econômico. “Hoje, temos a oportunidade de colocar em prática estudos acerca dos benefícios que estes insetos podem realizar aumentando a produção de frutos de importância para o ambiente Amazônico. A intenção é relacionar a pesquisa básica com a aplicada de forma a gerar benefícios para a melhoria da qualidade de vida das comunidades tradicionais”, enfatizou.
De acordo com Coletto, apesar deste projeto não envolver populações humanas diretamente, existem planos para a implantação desta cultura (camu-camu) em grande escala em áreas indígenas, em especial nas comunidades Murutinga e Tauaris (etnia Mura), ambas ligadas ao município de Autazes.
O projeto foi aprovado no âmbito do Programa Primeiros Projetos da Fundação de Amparo à Pesquisado do Estado do Amazonas (FAPEAM) e Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), e está orçado em R$ 21 mil. O trabalho está sendo desenvolvido sob a coordenação do pesquisador, Dr. Kaoru Yuyama, da Coordenação de Pesquisas em Ciências Agronômicas (CPCA/INPA), e dá suporte a um projeto maior de doutoramento da estudante Christinny Giselly Bacelar Lima intitulado: Estudos da Biologia Reprodutiva e Polinização Aplicados a Produção de Frutos em 15 Acessos de camu-camu (Myrciaria Dubia (H.B.K.) Mc Vaugh) Adaptadas a Terra Firme da Amazônia Central/Brasil.
Redes entomológicas: confeccionadas de tecido com malha (filó, tunil, organza, voile, etc), elas têm a forma de um coador de café com uma haste de arame resistente e um cabo de alumínio, os quais são utilizados para captura de insetos.
Luís Mansuêto – Ascon/Inpa