Tipo sanguíneo influencia no contágio da malária
16/05/2012 – Você já se perguntou por que há certas pessoas que pegam malária duas ou três vezes ao mês, enquanto outras nunca pegaram a doença durante o ano? Na verdade, conforme pesquisas científicas, o questionamento procede. Isso acontece porque a classificação do tipo sanguíneo influencia diretamente no número de vezes que você irá contrair a doença. Foi o que explicou o pesquisador da Fundação de Medicina Tropical do Amazonas (FMT/AM), Marcus Lacerda.
As informações fazem parte de estudos conduzidos no âmbito da Rede Malária – Programa de Apoio a Núcleos de Excelência (Pronex), coordenado pela doutora Graça Alecrim (FMT/AM), o qual recebeu investimentos de, aproximadamente, R$ 943,4 mil. O programa é uma iniciativa do Governo do Estado, por meio da Secretaria de Estado de Ciência, Tecnologia e Inovação (Secti-AM) e Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Amazonas (FAPEAM). A Rede Malária apoia a formação e o fomento de uma rede interregional e interdisciplinar de pesquisas em malária via intercâmbio entre instituições e pesquisadores, que concentram competências, da Amazônia Legal.
Existem várias classificações sanguíneas, de acordo com Lacerda, os mais conhecidos são os sistemas ABO e o sistema Rhesus (+ ou -), os quais são bastante utilizados por estarem relacionados ao processo de transfusão. Eles (os sistemas) servem para determinar se um doador é compatível ou não. Mas há também outros sistemas, como o Duffi, menos conhecido da população porque tem menos relação com transfusão, o que não o torna menos importante.
Segundo Lacerda, todo mundo tem Duffi. Ele (o sistema) se classifica em nove tipos até ser negativo na hemácia (célula vermelha). “Acreditava-se que os indivíduos Duffi negativo não contraíam o Plasmodium vivax, responsável pela malária. Todavia, o pesquisador da Faculdade de Medicina de São José do Rio Preto (Famerp-SP), Ricardo Machado, mostrou que alguns poucos pacientes contraíram a doença. Chegamos à conclusão de que o Plasmodium vivax está invadindo a hemácia usando alguma outra ‘fechadura’. Hoje, estamos discutindo quais os novos receptores que o Plasmodium vivax está usando para entrar na célula. Se descobrirmos como a invasão está ocorrendo poderemos trancar a porta com uma vacina. Quando entendermos o que faz com que as pessoas peguem malária poderemos descobrir um receptor na célula que pode ser alvo de uma vacina no futuro”, pontuou.
Pesquisas conduzidas pelo cientista Sérgio Albuquerque, da Fundação de Hematologia e Hemoterapia do Amazonas (Hemoam), com amostras de sangue de pacientes da FMT e da própria Fundação, demonstraram que pessoas do grupo Duffi AB contraem mais malária do que indivíduos do grupo A ou do B. Os resultados foram comparados com estudos feitos com pessoas do município Careiro Castanho (distante 102 quilômetros de Manaus), que há três anos são acompanhados pela FMT, e de São José do Rio Preto.
“As informações estão sendo confrontadas porque a carga genética das populações é muito diferente, por exemplo, as do Sudeste brasileiro e/ou da Ásia. Na Amazônia temos uma população negra, todavia há também gente oriunda do Mediterrâneo, sírio-libaneses os quais têm uma bagagem genética diferente. Os trabalhos vêm sendo feitos em Porto Velho (RO), Belém (PA) e em Manaus. A meta é verificar se outros indivíduos Duffi negativo também estão contraindo malária”, ressaltou.
Pessoas negras contraem menos malária
Conforme trabalho de doutorado realizado na Universidade do Estado do Amazonas (UEA), com 1,5 mil pessoas, feito em áreas de transmissão de malária na periferia de Manaus (zonas leste, norte e oeste), descobriu-se que 4,5% das pessoas analisadas tinham a deficiência genética da enzima glicose 6-fosfato desidrogenase (G6PDH). Há duas leituras para a questão. A primeira, o indivíduo que tem a deficiência tem menos chance de contrair a doença. A segunda, quando esse paciente contrai a malária ele corre o risco de desenvolver uma anemia grave.
Segundo o pesquisador, quando uma pessoa contrai malária pelo Plasmodium vivax, que corresponde a 99% dos casos em Manaus, o tratamento é feito com dois medicamentos: Cloroquina e Primaquina. “Quando o indivíduo tem deficiência da enzima G6PDH e é tratado com Primaquina, o medicamento pode destruir as células vermelhas causando uma anemia grave. Há casos em que o paciente morre por hemólise (destruição das células vermelhas). No Brasil e em nenhuma outra parte do mundo ninguém testa a deficiência da enzima G6PDH, pois é complicada. A deficiência está ligada à população negra. Em locais com concentração de populações negras, a deficiência pode chegar a 20%”, informou.
Pessoas com deficiência da enzima G6PDH podem pegar malária, segundo Lacerda, entretanto as chances são menores. Significa que a deficiência protege as pessoas contra a doença. “As pesquisas estão nos ajudando a entender como funciona a genética do hospedeiro (homem) para impedir que o indivíduo não desenvolva anemia profunda e morra por hemólise”, alertou.
Luís Mansuêto – Agência FAPEAM