Tratamento odontológico adota cimento portland
Apesar dos resultados, a adoção do material dependerá de novas pesquisas, tanto em dentes decíduos (de leite), quanto permanentes. O estudo faz parte do projeto de Mestrado de Ana Paula, desenvolvido na disciplina de Odontopediatria do Departamento de Odontopediatria, Ortodontia e Saúde Coletiva da FOB. Segundo a dentista, o cimento portland poderá substituir os dois principais produtos existentes no mercado para tratamento endodôntico, o formocresol e o MTA (agregado trióxido mineral). "A vantagem com relação ao primeiro é que o cimento é biologicamente compatível com os tecidos dentários", diz a dentista, "e com o segundo, é o preço, pois o MTA tem um custo muito elevado".
Foram avaliadas 68 crianças entre 5 e 9 anos de idade. “Além da redução de custos, o cimento traz a vantagem da biocompatibilidade, ou seja, o organismo aceita naturalmente o material, o que não acontece com o formocresol de Bukcley, substância introduzida em 1904 e mundialmente utilizada até hoje”, conta a dentista. “Pesquisadores do mundo inteiro buscam alternativas capazes de unir ganhos terapêuticos e econômicos para esse tipo de tratamento”, diz Ana Paula.
O cimento não traz conseqüências carcinogênicas (relacionadas ao câncer) e nem é tóxico. “Quanto ao formocresol, mesmo apresentando resultados satisfatórios, não há unanimidade na comunidade científica quanto aos seus efeitos colaterais”, compara a dentista. “Já o MTA é biocompativel, porém tem um preço elevado em comparação aos seus concorrentes”. Um grama do produto custa R$ 210,00, enquanto o valor médio de um quilo de cimento nas lojas de construção é de R$ 0,30. Um frasco de 20 ml de formocresol custa R$ 4,40.
Bactericida
De acordo com o professor da FOB, Ruy César Camargo Abdo, orientador da pesquisa, os resultados obtidos com o cimento portland são semelhantes aos apresentados pelo MTA, sob o ponto de vista terapêutico. “A única diferença é que no MTA é acrescido o óxido de bismuto, uma substância radiopaca que permite visibilidade radiográfica, mas que não apresenta nenhuma função terapêutica”, explica. “O cimento de construção é feito basicamente de calcário, não traz toxidade neste tipo de utilização e é bactericida por natureza, uma vez que possui um pH altamente alcalino”. O produto utilizado na pesquisa foi esterilizado.
O estudo conclui que o cimento portland é uma alternativa mais barata para o MTA e, conseqüentemente, também um substituto para o formocresol. A pesquisa foi iniciada em 2005 e as etapas clínicas e avaliações em 2006. Além da aplicação na polpa dentária de dentes de leite, o uso do cimento está sendo estudado para procedimentos de retro-obturação, reparo de perfuração de raiz, entre outros tratamentos endodônticos em dentes permanentes.
A pesquisadora recomenda que novos estudos em humanos sejam conduzidos antes de assegurar a indicação definitiva do cimento, tanto em pulpotomias de dentes decíduos (de leite), permanentes ou em outros campos da odontologia. “Serão necessárias principalmente avaliações em longo prazo e estudos microscópicos”, ressalta Ana Paula. “A utilização do cimento é bastante freqüente em estudos com animais, mas esta é a primeira vez que a ciência comprova sua a eficácia em humanos”. O estudo foi aprovado pelo Conselho Nacional de Ética em Pesquisa (Conep) do Ministério da Saúde.
A entrevista coletiva sobre os resultados da pesquisa acontecerá nesta quinta-feira (29), às 9h30, no Departamento de Odontopediatria, Ortodontia e Saúde Coletiva da FOB, localizada na Al. Dr. Octávio Pinheiro Brisolla, 9-75, Vila Universitária, em Bauru (interior de São Paulo). Estarão presentes a pesquisadora, Ana Paula Camolese Fornetti, e o orientador do trabalho, Ruy César Camargo Abdo. Maiores informações sobre a coletiva no telefone (0XX14) 3235-8203 ou pelo e-mail sci@usp.br, com Luis Victorelli.