Uma sensível compreensão da identidade amazônica
O caboclo ribeirinho “como sujeito social possuidor de um capital social que o torna parte de um agrupamento humano bem-sucedido nos seus processos adaptativos”. A expressão, fragmento do prefácio escrito por César Barreira, doutor em sociologia, ex-presidente da Sociedade Brasileira de Sociologia (SBS), compreende o espírito do livro Terras, Florestas e Águas de Trabalho – Os camponeses amazônicos e as formas de uso de seus recursos naturais, do sociólogo Antonio Carlos Witkoski, lançado pela Editora da Universidade Federal do Amazonas (Edua), com apoio da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Amazonas (Ufam).
“Terras, Florestas e Águas de Trabalho…” é resultado da pesquisa realizada por Witkoski no doutorado em sociologia da Universidade Federal do Ceará (UFC). Antes, porém, a teoria já havia começado a ser construída, durante um projeto de pesquisa realizada em parceria entre a Ufam e o Instituto Nacional de Pesquisa da Amazônia (Inpa), financiada pelo Instituto de Limnologia Maxplanck, em 1995.
Já naquela oportunidade, o autor passou a conviver de perto com a realidade, o cotidiano dos caboclos ribeirinhos, que, em sua obra, passou a chamar de camponeses da várzea, “sociologicamente”, como ele enfatiza. Com base na experiência, Witkoski oferece uma leitura dessa realidade a partir das práticas sociais e econômicas dos povos da floresta, demonstrando as diferentes atividades no mudo do trabalho do ribeirinho, que é agricultor, criador e extrator de plantas e animais (caça e pesca).
O autor se apropria dessa realidade para defender, articulando esse cotidiano a um referencial teórico competente, a teoria de que esse modo de vida é bem sucedido na adaptação do caboclo ribeirinho ao meio ambiente. “As populações são muito bem adaptadas à várzea, exercendo atividades na água, terra e na floresta. São agricultores, pescadores ou caçadores, à medida que a dinâmica dos rios condiciona os ciclos de trabalho na várzea”, explica Witkoski.
É exatamente a compreensão de que estas diferentes atividades configuram práticas sociais e econômicas que fazem o morador da várzea bem sucedido na adaptação às condições de vida, como salienta César Barreira no prefácio. “A adaptação é constituída na compreensão correta da relação entre o tempo da abundância e o da escassez, principalmente, na articulação do meio ambiente com o ciclo das águas”, acrescenta o autor.
A propriedade é representada socialmente pela terra, e a vastidão, pela água. Ambos são espaços de onde os camponeses da várzea desenvolveram os mecanismos de adaptação ativa e passiva ao meio. “O camponês da várzea tem uma singularidade que o diferencia de outros camponeses; ele trabalha de maneira seqüencial, e ao mesmo tempo, a terra, a floresta e a água”.
O tamanho das famílias na região de várzea, aspectos tradicionalmente referencial da cultura amazônica, também é ‘percebida’ pelo autor. De acordo com Witkoski, a organização e distribuição do trabalho tradicionalmente se dão em torno da unidade de produção familiar. “O tamanho da família determina o nucleamento do trabalho, que obedece à dinâmica da várzea, do trabalho polivalente”.
Em última análise, Witkoski diz que o camponês da várzea é produtor de riquezas, porém, perdem os ganhos de produção em um mercado injusto. “Infelizmente eles não são auto-suficientes e ao necessitar comprar ou vender, têm sua riqueza expropriada em um mercado repleto de intermediários”.
Ao lançar um olhar sobre a várzea, Witkoski traz à tona aspectos relevantes da subjetividade da vida dos povos da floresta e contribui para a compreensão da identidade amazônica para esta e outras gerações, de ribeirinhos e não ribeirinhos.
Sobre o autor
Antônio Carlos Witkoski é professor pesquisador no Departamento de Ciências Sociais (DCiS) da Universidade Federal do Amazonas (Ufam). É graduado em Ciências Sociais pela Universidade Vale do Rio dos Sinos (Unisinos) e Mestre em Sociologia pela Universidade da Bahia (Unb). Publicou em forma de livro os resultados de sua pesquisa de mestrado Diversidade Intelectual e cultura política: abordagem gramsciana da pedagogia petista (ANNABLUME, 2000).
O livro “Terras, Florestas e Águas de Trabalho – Os camponeses amazônicos e as formas de uso de seus recursos naturais”é resultado da pesquisa realizada por Witkoski para o doutorado em sociologia na Universidade Federal do Ceará (UFC).
Recentemente, Witkoski foi eleito membro da diretoria Sociedade Brasileira de Sociologia (SBS), durante o Congresso da Associação Nacional de Pós-Graduação em Ciências Sociais (Anpocs). A eleição ocorreu no último Congresso Brasileiro de Sociologia, no início de junho, em Recife (PE). O pesquisador também é assessor técnico na Secretaria de Estado da Ciência e Tecnologia (SECT).