SECT defende mudança na Lei de Propriedade Industrial


O secretário executivo da Secretaria de Estado de Ciência e Tecnologia, Marcílio de Freitas, defendeu esta semana, durante o Seminário Rede Norte de Propriedade Intelectual, realizado em Manaus, mudança na legislação brasileira para garantir o reconhecimento do conhecimento tradicional dos povos da Amazônia e a patente de produtos da biodiversidade. O evento foi realizado no auditório da Fundação Centro de Análise, Pesquisa e Inovação Tecnológica (Fucapi).

Depois da exposição da Chefa da Divisão de Patentes da Biodiversidade do Instituto Nacional de Propriedade Industrial (INPI), Margarete Maia da Rocha, em que apresentou as dificuldades de reconhecimento de patentes de produtos criados a partir de plantas e animais e do conhecimento tradicional pela Lei de Propriedade Industrial (Lei 9.279/1996), Freitas afirmou: “O que está errada é a legislação. Temos que mudar isso”.

Para o secretário executivo da Sect, a lei precisa contemplar os interesses do Estado, do mercado e principalmente dos povos tradicionais. “Se o objetivo da lei é garantir o usufruto dos resultados obtidos com o conhecimento tradicional por parte do mercado, evidentemente que os povos da região, que são detentores do conhecimento tradicional têm que ter uma inserção maior, primeiro no processo de discussão e, segundo, no usufruto dos resultados da lei”, disse.

Freitas também defendeu a criação de uma política pública federativa que regulamente o processo produtivo, mas que também leve em consideração o conhecimento tradicional e a propriedade intelectual. Mas alertou que esse processo de discussão não vai avançar se o País excluir os povos tradicionais dos debates.

Sistema de patentes

Outra mudança defendida pelo secretário executivo da Sect é no sistema de patentes mundiais, que não leva em consideração o conhecimento produzido pelos povos indígenas, por exemplo. “O mundo não é feito apenas de mercadoria”, afirmou.

De acordo com ele, a grande novidade do século 21 para a ciência são os microorganismos, que não estão contemplados no arcabouço jurídico mundial sobre propriedade intelectual. “Os cenários da ciência no século 21 são outros, existe um outro tipo de estética da natureza. Isso precisa ser levado em consideração pelos países desenvolvidos”, disse.

As patentes e a discussão com relação à normatização dos produtos oriundos da Amazônia, em geral, não levam em consideração as questões simbólicas incorporadas aos produtos, que são utilizados no cotidiano dos povos tradicionais, na avaliação de Freitas. “Por exemplo, o patenteamento da fruticultura da região: uma boa parte da fruticultura foi domesticada pelos povos da Amazônia. Então, a exploração dessa atividade tem que levar em consideração os direitos dos povos”.

Dificuldades de regulamentar

Margarete Rocha, do INPI, afirma que a grande dificuldade de regulamentar a propriedade intelectual dos povos tradicionais é a falta de definição de autoria. A legislação define a propriedade intelectual como direito exclusivo de uma pessoa física ou jurídica. No caso dos povos tradicionais, essa propriedade é difusa, pertence ao grupo. “Como é que se vai discernir quem é o detentor do conhecimento no campo dos inventores, por exemplo? Às vezes é uma comunidade monstruosa”, explica.

A representante do INPI aponta a necessidade de uma regulamentação ou um contrato entre as partes (povos tradicionais e empresa privada, por exemplo) que defina quem são os atores. “É uma cooperativa que vai regular e depois repassar os benefícios para o grupo? E aí, firma-se um compromisso com esse representante e a indústria farmacêutica. Uma vez definido isso nos autos do processo, nós analisamos o pedido como outro qualquer, como eu expus aqui”, disse.

Legislação a caminho

O secretário-executivo da Rede Norte de Propriedade Intelectual, Eugênio Pantoja, informou que existe um anteprojeto de lei cuja proposta foi elaborada pela Casa Civil, com a participação de outros ministérios, com o objetivo de regulamentar a gestão dos recursos genéticos e a proteção do conhecimento tradicional.

“A proteção do patrimônio intelectual coletivo não tem acento na legislação de propriedade industrial. O que existe é registro de cultura, mas como manifestação cultural e não como propriedade intelectual. Isso é feito pelo Ministério da Cultura, como registro de reconhecimento cultural. Não existe registro de propriedade intelectual coletiva, que é o que estamos discutindo aqui”, disse Pantoja.

A legislação que o Brasil tem hoje, além da Convenção da Diversidade Biológica (CDB), é a Medida Provisória 2.186/2001, mas ela tem se mostrado insuficiente para garantir os direitos dos povos tradicionais à repartição dos benefícios gerados a partir de seus conhecimentos.

Existem sugestões no Brasil, segundo Pantoja, de se criar o que alguns estão chamando de eco-regiões ou etno-regiões, que serviria como uma espécie de indicação geográfica de onde é aquele conhecimento, aquela cultura, aquela forma de fazer e utilizar a biodiversidade. “Mas isso ainda não está concretizado em forma de lei”, lamenta.

Escritório do INPI

No final das discussões, Freitas sugeriu à representante do INPI, Margarete Rocha, a instalação de um escritório do instituto em Manaus, para auxiliar os pesquisadores na tarefa de registrar marcas e patentes. A proposta de parceria com o INPI será amadurecida, na perspectiva de oferecer ao Amazonas formação técnica, gestão e pós-graduação em propriedade intelectual e inovação. “Nós vamos levar essa proposta para o instituto e vamos analisá-la com muito cuidado, porque é uma ótima proposta”, afirmou Rocha.

Para justificar o pedido do escritório do INPI no Amazonas, o professor utilizou números: a região norte, disse Marcílio, tem apenas 615 patentes e marcas registradas no INPI, enquanto a região Sul, com apenas três estados, tem mais de 16 mil marcas e patentes registradas. “É muito pouco para os Estados da região Norte”, afirmou.

Valmir Lima – Agência Fapeam

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